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quarta-feira, 25 de agosto de 2010

CONJUNTOS MUSICAIS - Tranquetenas do Ritmo

Em página anterior dei a conhecer um pouco do que a minha memória recorda, em passos muito largos, sobre a evolução das actividades musicais que timidamente despontavam em Alcains.

Já com os Beatles em consolidação, um pouco por todo o país e também em Alcains, apareceram os conjuntos musicais.

Tal como o nome indica TRANQUETENA, parece ser assim uma "coisa sem jeito", "fora do comum", "que não tinha por onde se pegar" assim me dizia o Tó Damas que aparece na foto em pose de viola solo, com casaco de músico a assertoar de seis botões.
No entanto penso que Tranquetena, derivará popularmente de Traquitana, que era um carro desconjuntado e reles, segundo o Torrinha de boa memória.
Foi ele Tó Damas que, aprendiz de serralheiro na Metalúrgica ISIDROS, construiu a caixa e da pele curtida de um borrêgo do tio, fez assim o primeiro instrumento dos Tranquetenas do Ritmo.

Entretanto, nos intervalos das corridas das festas populares, calhou ao Domingos Bispo o lugar de Baterista, que a foto documenta de melena ao léu, gravatinha centrada na camisa branca de TV, e de sapatinho engraxado marcava o ritmo dos Tranquetenas com as báguétes de mogno ressonando na caixa e no réco-réco.
Mas o verdadeiro ideólogo de tal aventura, qual Jonh Lennon em ascenção, era o Tonéca Caldeireiro que de micro em punho, casaco desapertado , cabelo maior que as orelhas e de porta chaves pendurado na presilha das calças, desafiava pelo estilo e concentração, qualquer Calvário ou Garcia.
Diz-me o Domingos Bispo que ele, Tonéca Caldeireiro lia muito, nomeadamente a Revista Plateia e por aí sabia o que se passava no meio musical, já tinha em casa um rádio, e tudo isso era uma vantagem adicional.
Era no dizer do Domingos o que tinha mais jeito.

Por último,o João Tchéna que não cantava, pois fumava, tinha estilo quase igual ao do Tonéca e parece que tocava banjo ou banjola, solista eventualmente quando o Tó Damas decidia fazer de viola ritmo.

Eram estes quatro jovens que não compondo,cantavam as cantigas dos outros, na eira do Ti Caldeireiro, pai do Tonéca, e ali podiam berrar à vontade, ninguém os ouvia, e nem os seminaristas incomodavam... ensaiavam à noite à luz de petromax... não havia por ali luz eléctrica.
Nenhum deles sabia uma nota de música, mas conheciam as cordas, faziam algumas posições... pois não sofriam das costas... aquilo era para cima e para baixo,com palhêta a silvar nas cordas.

O maior êxito conhecido, com música de "Coimbra Menina e Moça" foi uma letra não protestada que rezava assim:

O amor é de nós dois,
De nós dois e mais ninguém.
Quero que tu sejas minha,
Pra te amar ó meu bem.

Mas... há sempre um mas... e, recebendo um convite para ir tocar a um casamento de amigo aos Escalos de Baixo, acompanhando um acordeonista, iam "a de comer", um deles faltou e foi suibstituído pelo Manuel Pereira e parece ter havido um "quiprócuó" com o emblema que era uma clave de sol sob estrela de três pontas...

Quando passou a febre, acabou.

Manuel Peralta

MÚSICOS/MÚSICA - Bandas e Fadistas, Conjuntos e Acordeonistas... demais artistas.

Onde hoje está o edifício da praça, existiu antes um café propriedade do Sr. José Fortunato, baptizado popularmente por "café do Fláitas", que, pelo entusiasmo do Sr. Fortunato e pelas suas inatas qualidades musicais, funcionou por volta de 1965 durante meia dúzia de anos como a sala de ensaios dos "a caminho de músicos" de então.
Zé Ribeiro, falecido, Manuel "Vaquinha", irmãos Messias, Manuel "Bálhinhas", Sr. Fortunato... e apareciam por lá dois aspirantes a artista, um a baterista, João Preto, e outro a vocalista, Manuel Peralta.
Ficaram pelos ensaios, e, por vezes, actuavam frente ao café do Sr.Fortunato para ali atrair clientes.
Como se vê, não foram muito longe...
Antes, e por espírito santo de orelha meu, isto é de ouvido, Alcains teve um "jáze" onde os Rafaéis, Moisés, João, dois Josés, entre outros com Joaquim Teixeira incluído, com instrumentos de sopro e violino, formaram o dito "jáze" que parece ter deliciado e encantado as gentes de Alcains, em serenatas, nas festas de Natal e sempre que alegria familiar a tal convidava.
O Vaquinhas com o seu acórdeon seguiu o seu caminho em casamentos, descascas e voltas da malta da inspecção por vezes, acompanhado pelo João Preto de bateria (2 pratos, taróla, bombo e réco-réco), e uma vez por outra o Peralta, munido de voz e massanêtas oferecidas pelo Sr. Fortunato.
Os manos Messias actuavam nas variedades nos teatros, acompanhando o Anselmo, a Deolinda (Pirilau) um ou outro fadista de Castelo Branco e o próprio Manuel que tinha e tem voz...
O Manuel Bálhinhas vinha da banda e para lá retornou...
Entretanto na Europa, o Maio de 1968 em França, decretou que era proibido proibir... e a libertação de ditos velhos usos e costumes entrou pela casa dentro como cão em vinha vindimada...nada a fazer portanto.
O Simão Lêtcha, qual Elvis Presley do Degrêdo, ensaiava e ensinava na praça frente à tasca do Ti Domingos da Venda, os passos de “twist” para gáudio de todos os aspirantes a cabeludos de melena a tapar olhos e calças à boca de sino...
Elas, as moças, enquanto iam de caldeiro de encher à fonte, começaram a por algodão em rama para encher as malgas dos “soutiens” a calçar socas que lhes aumentava a altura, e uma ou outra mais ousada começou em testes de mini saia...
Entretanto, nas comédias da rua da Fonte, o Raúl Pirilau que se oferecia sempre como voluntário para as mandingas dos palhaços, alçava o rabo onde o palhaço introduzia o bico do funil e de lá saíam metros e metros de rolos de fita de carnaval par júbilo de toda a canalhada que pensava que iam sair sardinhas...
Baladas, baladeiros, zip-zip, página um, este disco é intocável mas não é inquebrável que deu que falar... o soldadinho não volta... do outro lado do mar...
Bailes à porta aberta e fechada, de estudantes, das costureiras do Sr. José Marques e Dª Palmira, mestra, com o gira discos do Alírio e do Rabeca...
Escuteiros e anti-escuteiros, fogos de conselho, acampamentos, teatros, dramas... matei o meu filho, advogado da honra, entre giestas... comédias, operêtas pelo que o demais são trêtas.
Conjuntos...

Manuel Peralta

PARDAL - João Rodrigues Barata

Pardal viajado, o Ti João, suportou os calores do Baixo Alentejo construindo o Quartel de BEJA, na ampliação do Liceu de NUNO ÁLVARES em CASTELO BRANCO, onde se destacam umas primorosas letras esculpidas no granito, ou em CELORICO da BEIRA numa emblemática ponte sobre a linha de caminho de ferro, que eu bem conheço.
Hoje com 84 anos, casado, fez a quarta classe aos 14 anos e depressa passou para as pedras... uma verga aqui, uma torse acolá, um lintél mais álem e muitos mas mesmo muitos juntores para casas de muitos doutores... em Serpa, na Guarda, no Paúl, no Monte Trigo, em Moura e até em Pias onde ao que consta tinha tias...
Tirou a carta de Canteiro com os mestres António David e José Rôxo.
E porque o tenho como homem sério, em Vale de Lobo também andou ao minério.
Trabalhando para um GRANDE ALCAINENSE, o Sr. António Loureço Barata, vulgo TÉRLÉ, construiu em Lisboa para a Marinha as cantarias do Arsenal do Alfeite.
Mas PARDAL, porquê?
Eram cinco irmãos, 2 catchópos e três catchópas.
O irmão chamava-se Arnaldo e tinha a pele mais escura e por esta evidência, apelidaram-no de Farrusco.
Ora o farrusco, para os estudiosos da ornitologia, estudo das aves, é uma espécie de pardal com as penas mais escuras, algumas, as remiges, até são mesmo pretas.
Como o Ti João tinha e tem a pele mais clara, claro, apelidaram-no de PARDAL, até hoje e para sempre.
Durante sete anos, por volta de 1962, teve uma sociedade com o Joaquim Fradique, e durante 32 anos com o Manuel Maria Sanches, precocemente falecido, teve uma das melhores empresas de granitos de ALCAINS, a Sanches & Barata, cuja actividade se iniciou em 1969.
PARDAL velho que é, não cai em costil, ronda-o, estuda-o e espera que farrusco novo e imprevidente entre de frente ao grão de milho... depois de atefegado, Pardal velho come então o milho, relaxado...

A propósito, conhece em Alcains o Sr. João Rodrigues Barata?
Não!!!
E o Ti João Pardal?
Quem não conhecer, presumo que anda mal...

Manuel Peralta

domingo, 22 de agosto de 2010

TAJANA - José Martins de Oliveira

Filho de João Martins e Ana Clara, oriundo da rua do Regato da Sola a caminho da Laje da Judia, em casa com varanda de granito com alminhas por perto, vizinho do ti Zé Saraiva e do Ti Domingos Laroupo, para quem um só meio quartilho era pouco, herdou de seu pai, tal como os restantes irmãos, o apelido de TAJANA.

E Tajana porquê?
Seu pai, João Martins jogava com outras crianças, aos botões...
Jogava com uma marca em chapa, botão de chapa que saltava melhor que os vulgares botões e que na bolsa de valores do outeiro tinha uma cotação de 10 vulgares botões.
E ao jogo, ao João Martins, naquela sombria manhã as coisas não corriam nada bem... estava a perder para todos, e, no livro de assentos, a dívida em botões já superava o PIB amealhado na metálica marca que maravilhava ouvidos de criança, no toque em parede de rebôco picado e no tilintar de sobrado.
Até se dizia no Outeiro... se queres namorar a minha mana pede a marca ao tajana...
A um devia 5 botões, a outro mais 2, até ao filho da Laroupa que tirava botões à roupa, devia sete...
Teso, sem crédito, com credores não à porta mas já à perna, um deles, credor em gesto irreflectido, arrebata e foge com a marca...
Gritando, correndo atrás dele, vociferava... dá-me a minha botanjana... dá-me a minha botanjana... dá-me a minha botanjana...
De botanjana... a língua popular fez o resto, passou a Tajana.
Em TajANA qual simbiose perfeita está a sua mãe, ANA.
O ti Zé Tajana tem 76 anos, casado e tem um filho.
Aos 10 anos já andava pela Marinha Grande, foi operador de maquinas pesadas, caterpilar, condutor de cilindros a lenha e emigrou mais tarde.
Sportinguista de muitos costados, não tem tido por ali muitas alegrias... sabe esperar...
No CDA como seccionista colaborou ajudando a equipa, mas foi na construção da sede do Grupo Onomástico os Josés de Alcains que o Ti Zé Tajana se notabilizou.
A um pedia mobília, a outro terreno, acoli uma rectroescavadora, acolá blocos e cimento.
Tratava do petisco, moço de fretes e recados para que nada faltasse aos que, menos abonados, pagavam em trabalho semanal de pedreiro, rebocador, ladrilhador.
Naquela explêndida sede, infelizmente com muito pouco uso, o ti Zé Tajana deu tudo o que tinha pelo que me parece justo este apontamento, corroborado pelo meu pai e pelo Ti Zé Penedo (churro), já falecido, que me contavam do entusiasmo do Zé Tajana.
É certo que outros serão dignos de igual mérito mas cada coisa a seu tempo.
Ao pé dele está-se bem pois tem muitas histórias para contar... é uma malhação...
Relembro apenas uma:
Diga-me lá, se já não se recorda do seu melhor amigo em França, aquele que lhe valeu quando aquele azar se deu?
Parece que só em náperons foi gaveta cheia!!!
A propósito, conhece em Alcains o Sr.José Martins de Oliveira?
-Não.
E o Zé Tajana?

Manuel Peralta

SAÍNHAS - João Bernardo

Na senda incessante que pretende investigar a razão dos apelidos, chegou agora a vez do Ti João Bernardo que por este nome é mais um desconhecido em Alcains.
No entanto se se perguntar pelo João Saínhas, decerto que a procura será mais fácil.
Por vezes os apelidos resultam de actos e acções muito simples, como o caso em apreço.
Andava o João Bernardo oriundo da Avenida sem saída no pino do Outeiro, brincando ao béfo com uma tal menina de seu nome Maria dos Reis, ali pela rua do Torrejão.

Ou porque ele pisou e ela não gostou, ou porque imprudente não lhe deu o lenço, houve desentendimento com nomes à mistura...
Ao que ela, Maria dos Reis lhe terá apontado... és um saínhas!!!
Ao que ele por a mãe dela ser gorda lhe terá ripostado... és uma lôba!!!
Ele ficou para sempre baptizado como João (Saínhas) e ela eternamente a Maria dos Reis (lôba).
Conheço ambos, vizinhos em criança de meus pais, em casa da mãe da Maria dos Reis, no Degredo eram frequentes os bailes abrilhantados pelo maior ”realejista“ da altura o Ti João Tabaco, que de realejo na boca abrilhantava festas, serenatas e descascas.
No próximo dia 5 de Setembro o Ti João Bernardo fará 86 anos, toda a vida trabalhador, tem 3 filhas que presumo não herdaram o apelido do pai.

Manuel Peralta

sábado, 21 de agosto de 2010

BLOG ABERTO - FUTEBOL, Primeiras Glórias

Mais uma prosa do Manuel Geada acompanhada de uma inédita e presumo que talvez única foto dos primeiros futebolistas organizados de Alcains.
Com excepção do factor da estação, do Grancho e do pai do João Mira todos reconheci.Curiosidade dos diabos foi o facto de ter sido vizinho do Ti Chico Preto durante 25 anos, ter bebido alguns copos com ele na sala onde estava esta foto e só agora via Manuel Geada, me aperceber deste achado.
Aí fica ele para a posteridade e para a história do futebol em Alcains.

Manuel Peralta

PRIMEIRAS GLÓRIAS DO FUTEBOL DE ALCAINS


Em cima da direita para a esquerda.
Francisco Pires Preto, João Fontainhas, João Pires Preto, António Henriques
António Lopes Bemposta, Factor da Estação, Henrique Caniça
Em baixo.
José Lopes Sousa, João Pereira Biqueira, Francisco Lopes André, António (Grancho)

Esta foto foi tirada num campo de futebol que existia no local onde hoje está construída a antiga fábrica de lacticínios em São Domingos.
(Eu pensava que o futebol em Alcains tinha nascido na tapada do ti Júlio).

Esta foto foi-me cedida pelo ti Tchico Preto e esposa, ti Ressurreição.
Dizem que é uma peça única. Tiraram-na do quadro para me a emprestarem. Quando ia a sair a porta diz-me a ti Ressurreição, Manel pela alminha da tua mãe, não dês caminho a essa fotografia.
Como já tinha falado com a Cláudia Baltazar (da Alma Azul), um quarto de hora depois já estava de regresso com a relíquia.

Dizem eles que ninguém em Alcains tem conhecimento desta foto. Imagina a surpresa de algumas famílias o dia em que ela for publicada no blogue. Enfim como se costuma dizer, tive uma sorte dos diabos.
Eu quando me dirigi ao ti Tchico foi para o interrogar sobre a sua participação no futebol, aquando dos jogos entre casados e solteiros que se realizavam na boa época, anos cinquenta.
Ainda eu era muito moço mas recordo-me que o ti Tchico defendia sempre a baliza dos casados e, que um dia durante um desses famosos jogos no qual lhe tinham atribuído uns calções grandes, o homem viu-se negro durante todo o jogo, tinha que segurar o calção com uma mão e com a outra tentar agarrar a bola: aquilo foi um espectáculo, principalmente para nós canalhada.
Eu falei-lhe nesta história mas ele não reagiu, a ti Ressurreição diz que infelizmente ele está a perder muito a memória mas, se eu necessitar de mais alguma informação talvez ela me possa ajudar.
(De todas estas Velhas Glórias, o ti Tchico Preto é o único ainda vivo. O simpático casal estava um pouco comovido ao recordar e contar isto).

O ti Tchico toda a gente o conhece.

O João Fontainhas, era negociante em peles, morava na Rua do Chafariz Velho pegado à “fábrica dos pirolitos”, e tinha dois filhos que talvez te lembres deles. Eram o Carlos e o Jorge Fontainhas, este útimo terá hoje 62 anos no máximo. Mais tarde foram viver para Castelo Branco.

O João Pires Preto, era irmão do ti Tchico (tenho uma vaga ideia do homem).

O António Henrique, trabalhava na Auto Mecâmica da Beira, tinha uma Vespa e habitava onde é hoje a sede do Sporting, ou então na casa do Alvaro Bispo.

António Lopes Bemposta, era irmão do ti Zé Mira e pai do João Mira. Num dia de consoada ao descer com o camião de Tinahas para Póvoa, despistou-se na curva da ferradura (Não posso afirmar mas, creio que a esposa já estava a fazer as filhós quando chegou a má notícia).

Este Factor da estação, a ti Ressurreição não conseguiu lembrar-se do nome, era natural de Vila Velha de Ródão, mas trabalhava e habitava na estação da CP (Ela disse que ia deixar a foto à mão para ver se lhe vinha à ideia o nome do homem e, como eu passo por ali muitas vezes depois chama por mim).

O Henrique Caniça, com certeza que ainda lá foste comprar algumas bombas, bitchas e luzes como a gente lhes chamava.

José Lopes Sousa, era filho do ti Tchico Sousa (barbeiro) e da ti Patrocínia; tinham uma mercearia na Rua Longa (cunhado do ti Manel Pereirinha).

João Pereira Biqueira, à certeza que conheces-te (pai do Armando).

Francisco Lopes André, era o Sr. Tchico Lopes que morava junto à casa e escritorio do Sr. Trigueiros, pai do Jorge, tinha ainda outro filho Dézé que devia ter sido teu colega de escola, conteporâneos, digo eu.

Antonio (Grancho), morava na Pedreira, a ti Ressurreição não se recordava do nome de família mas, diz que o vai conseguir porque conhece alguma família (Grancho) por ter o cabelo todo eriçado, carapinhado).

Como também já tenho muitas informações sobre o futebol na tapada do ti Júlio, ainda vou tentar fazer alguma coisa sobre as Velhas Glórias: os comentários depois farão o resto.

Um abraço

Manuel Geada

BLOG ABERTO - Guerra Colonial

É do Zé Minhós Castilho esta página do ” livro da vida”, que foi a da generalidade dos Portugueses.
Fomos lá quase todos... poucos eram os amparos de mãe ou os que, por actos pouco valerosos, das cunhas não se libertaram...
Em Angola, Moçambique, Guiné-Bissau, apenas para referir as ditas colónias onde a guerra era mais acentuada, todos demos uma parte da nossa juventude.
Atiradores muitos, sapadores bastantes, amanuenses raros, criptos, cozinheiros, magarefes, condutores, transmissões enfim um desfilar de especialistas e especialidades que uma máquina de guerra arrasta consigo.
Revejo-me emocionadamente no poema abaixo publicado pois ao lê-lo, relembro o Niassa, a partida, o cais da Rocha do Conde de Óbidos, os acenos, as lágrimas, a despedida...
Para ajudar a compor a página publico uma foto da minha “guerra“ na Guiné-Bissau.
Uma vez que fomos lá quase todos, fica o repto, para mais fotos, histórias, amizades...

Esta é tambem uma forma de, dando testemunho, homenagear os Heróis de Alcains.

Manuel Peralta

Alcains... Anos 60... Guerra Colonial!... Uma terra em que as angústias pairavam em muitos lares!
Hoje é um tema recorrente falar das consequências físicas e morais resultantes de uma Guerra que abrangeu uma geração. Entre 1960 e 1975, por esse país fora, houve muitos lares enlutados e mazelas físicas e psíquicas em muitos jovens que viveram essa experiência.
Quem consegue esquecer os gritos, os lamentos, os ais, do povo que no Cais da Rocha de Conde de Óbidos, se despedia dos seus, quem sabe se para sempre!?
Quantos dramas o Vera Cruz e o Niassa, principalmente, não testemunharam!
Depois foi toda uma experiência, em alguns casos vivida nos limites, em que o sentimento da camaradagem se sobrepunha ao medo.
E as noites de Natal no mato! São experiências e recordações que ficam para sempre!
E quem viu morrer camaradas a seu lado, ou ficarem para sempre estropiados, nunca mais esquece.
E cá?
O drama das famílias aguardando os aerogramas que nunca mais chegavam…
Entre 1960 e 1975, o aproximar dos 18 anos, era como que o entre acto para uma guerra que estava logo ali. E até para os graduados, um pouco mais velhos, mas na casa dos 20,s anos, era com um misto de apreensão e incerteza, que viam o terminar dos seus cursos. Porque para uns, surgia Mafra no horizonte, e para outros, os que iam chumbando, uma ida para as Caldas da Raínha.
Portanto era uma juventude com o credo na boca!
Alcains não escapou à gadanha da morte na Guerra Colonial. E em site que voga aqui pela NET, podemos identificar aqueles que da “terra dos cães” deram o melhor de si próprios a uma causa, que hoje avaliamos inglória, mas que devemos recordar:

António Gonçalves Vicente – 2º Sarg – Ang.- por doença – 09.07.64 – cemit. Alcains
Hélder Sanches Pires – 1º Cabo Com. –Ang.- em combate - 05.04.63 - cemit. Vista Alegre
João Maria Ribeiro Martins – Sol. Com.- Ang. - acidente - 26.10.71 - cemit. ???
João Martinho Samarra Coelho – Sol. Atir-Ang. – afogado –29.11.61 - corpo não recup.
Mário Lopes Amaro Pires – 1º Cabo – Moç. – acidente – 13.03.74 - cemitério de Alcains.
O site consultado tem a data de 01.11.2009.

Nas duas páginas referentes ao concelho de Castelo Branco, são identificados 61 mortos.
Recordo-me de ver no cemitério de Alcains, algumas, não sei quantas campas da Liga dos Combatentes. Porém o site donde recolhi estes dados é relativamente recente como se vê.
A única baixa identificada em combate, é a de Hélder Sanches Pires, também ele uma velha glória do desporto em Alcains. Praticante de Atletismo de inegável valia, creio que também foi um 7 de relevo na equipa de futuebol do GDA.
E encontrei também na NET, referências à sua morte e uma foto da sua campa em Angola, junto da qual os seus camaradas de Grupo, o relembram e provavelmente murmuram uma oração.
Transcrevo as palavras que se referem ao nosso conterrâneo (…) Natural da freguesia de Alcains, concelho de Castelo Branco, mobilizado pelo BCaç 6, para servir na RMA, integrado na CCS do BCaç 186, depois integrado no Grupo de Comandos de Aço, tombou em combate em 05 Abril 63 no decurso da penúltima actividade operacional daquele GrCmds, efectuado nas imediações da sanzala Quizondo (área de Úcua).
Está sepultado na campa 6 do cemitério de Vista Alegre, em Quitexe, Angola (…).
Através de um site de procura, lancei um apelo a que algum camarada daquele Grupo de Cmds, venha por aqui esclarecer mais algum detalhe sobre a morte do popular alcainense que dava pelo nome de Hélder “Arraiano”.
Com a devida vénia aos autores da foto e do site onde pesquisámos estes dados, aqui fica para a posteridade a foto da campa de um dos nossos, a quem a sorte foi madrasta e que quase no fim da Comissão tombaria e ficaria para sempre em Angola.


Um Alf. Milº que serviu em Noqui, Angola, tal como o autor do texto, homem de rara sensibilidade, compôs um poema que eu não resisto a divulgar. Este Poema condensa as amarguras, as tristezas e a solidariedade de quem andou na Guerra e teve a sorte de sobreviver para contar:

O regresso

Dois anos de saudade
Noutro cais, no mesmo mar, noutra cidade
O mesmo paquete atracado
Imponente nos deques se erguia
Maravilhoso tudo quanto se via
De um verde suave, pintado

Da proa à popa iluminado
Para os soldados, todo reservado
O barco parecia compartilhar
De braços abertos, para receber
Os que da guerra conseguiram sobreviver
Escotilhas fechadas, pôs-se a navegar

Mas no porão daquele navio
Diz quem viu
Também regressava encaixotada
O que fora vida e agora nada
Para ser entregue à chegada
À família, dilacerada

E quanto mais milhas percorria
Mais aumentava a alegria
Tudo tinha um significado diferente
O passado parecia um sonho
O futuro anunciava-se risonho
Que felicidade a daquela gente!

Ao nono dia
De madrugada, ainda mal se via
Primeiro o Bugio, depois a cidade
E quando o barco acostou
Só visto o que se passou
Terminou a saudade

De novo, prantos, lágrimas e ais
De tudo houve naquele cais
Nova vida ia começar
Os passageiros e navio, por imposição
Tinham cumprido a sua missão
Que Deus os queira abençoar

De anos a anos nos vemos
E em cada ano somos cada vez menos

Beja, 2009. 12. 06
M.D. Horta

Texto coligido por MC

BLOG ABERTO - Monumento ao Sagrado Coração de Maria no Largo de Santo António

Mais uma boa participação do Manuel Geada que dá a conhecer uma das obras emblemáticas, senão mesmo a mais emblemática de Alcains.
Observador privilegiado do local, testemunha para memória futura a construção, seus intervenientes bem como o benemérito que a mandou executar.
Sugere ainda e muito bem que, na base do monumento, seja colocada uma lápide com o nome do seu principal executor, Joaquim dos Santos (Fradique) de seu nome.
Uma vez que ele mesmo refere outros intervenientes, poderia em meu entender, alargar-se a todos eles o reconhecimento.
A imigração CANTEIRAL Alcainense dispersou a sua arte um pouco por todo o país, principalmente na corda interior desde Beja até à foz do Côa, limite do distrito da Guarda.
Foi sempre minha intenção, através do blog, dar a conhecer quem fez e onde está a arte dos Canteiros e Pedreiros da terra deles que é a nossa...
O Manuel Geada no seu Alcainês do largo de Santo António deu o seu valioso testemunho.
Quem se segue?

Manuel Peralta

MONUMENTO AO SAGRADO CORAÇÃO DE MARIA NO LARGO DE SANTO ANTÓNIO
Dizem que todos os caminhos vão dar a Roma. Em Alcains todas as ruas vão dar ao Largo de Santo António e, por conseguinte ao nosso emblemático monumento do Sagrado Coração de Maria.

Mandado erigir pelo nosso conterrâneo José André Júnior no ano 1953, em reconhecimento de uma graça concedida, é aqui o principal ponto de encontro dos alcainenses.
Conheci o Senhor José André e sua esposa, a Senhora Maria dos Santos que nos anos quarenta e cinquenta do século passado, eram os grandes fornecedores de pão em Alcains, e terras vizinhas. (A senhora Maria dos Santos quando ocasionalmente me encontrava na rua conhecia-me e, dizia logo que era neto da sua vizinha, Ti Maria Duarte).
Casal exemplar, e muito empregador, era conhecido por ser amigo dos seus empregados, e ajudar os pobres da nossa terra.
Também a estes alcainenses se deve a construção da Escola da Feiteira(hoje infantário): que muita gente por não ter conhecimento, pensa ter sido construída pelo Estado Português.
Tinham uma padaria situada na Rua Longa, hoje Rua da Liberdade do lado esquerdo na traseira da igreja, que era também o local da sua residência. Ainda hoje lá está um bonito palacete bem conservado. Mais tarde a padaria mudou para o Largo de Santo António.

Toda a mocidade nascida nos anos quarenta e cinquenta, se lembra de algum dia lá ir à ti Piedade (Tira Linhas) comprar pão. Além do “pão trigo”, também se lá vendia um pão feito com farinha de centeio (na época o pão dos pobres), uma delícia .
Todo o pão era cozido em fornos a lenha, e amassado com a farinha produzida na fábrica do Senhor José André situada no Largo de Santo António (no local onde hoje está o prédio do café Santo António e banco Montepio Geral).
Voltando ao nosso “Monumento”; recordo bem a sua construção. Era ali o meu campo de jogos, porque morava ali ao lado, na Rua do Cemitério.
Naquela ocasião o Largo de Santo António era uma autêntica pedreira. Os enormes blocos de pedra extraídos no Capelo Delmo chegavam ali uniformes, para serem no local desbastados, aparelhados, e montados no sítio adequado.
Como toda a catchopada que habitava por ali, segui a construção do que para nós era uma obra colossal, do princípio até ao fim. Direi que éra-mos nós os fiscais da obra.
Lembro-me perfeitamente de ver os homens munidos de grandes alavancas de ferro, penar para arrastarem e colocarem no sítio, os grandes blocos que constituem a sua base.
Os blocos mais pequenos, uma vez aparelhados e arrastados até ao local já foram içados com um guincho (guindaste) com duas manivelas movidas algumas vezes por dois homens em cada uma, que os punha quase no local que lhes era destinado.
Não me recordo quanto tempo foi necessário para a construção da coluna, mas, também não tenho ideia de ter incomodado a realização da festa de Santo António (no início do mês de Julho), e a feira dos Santos (dia 1 de Novembro).

Perguntei a alguém que lá trabalhou, também não se recordam do tempo que demorou a sua construção, nem do valor da empreitada.
Trabalharam nesta construção Joaquim dos Santos(Fradique), José dos Santos(Fradique), Joaquim (Bichinho), António (Gravisso), Manuel Martano, Francisco dos Santos Leão (Tchico Puto), e o meu amigo João Maria (filho do mestre da obra) que na época com doze anos de idade, já exercia os cargos de aguadeiro, ir ao ferreiro e, nos tempos livres, também já ajudava a desbastar os blocos.
Uma vez a coluna erigida, recordo-me como se fosse ontem, ouvir o Sr.Vigário (Padre António Afonso Ribeiro) num domingo dizer durante a celebração da missa, que um certo dia da semana(não me recordo qual) pelas três horas da tarde chegava a imagem do Sagrado Coração de Maria e, quem pudesse, fosse ao Largo de Santo António orar para que a estátua não caísse, enquanto efectuavam a delicada nanobra de a por no pedestal.
É quase inútil dizer-vos que estava presente Alcains em peso, o recinto estava repleto de gente de joelhos a rezar, enquanto a imagem ia subindo ao ritmo das voltas que davam as manivelas do guincho manipulado por homens destemidos e fortes. Tudo se passou bem; a imagem lá ficou no cimo com um grande terço nas mãos, hoje desaparecido?
Mas quem foi o grande mestre de obras e artista canteiro alcainense, responsável pela construção deste nosso emblemático monumento???
Vós da minha geração e anteriores ainda vos recordais mas, os vossos irmãos mais novos, os vossos filhos e netos, alguma vez ouviram sequer pronunciar o seu nome?
Imaginem o orgulho de um bisneto ou trineto do “ARTISTA”, mostrar a um amigo de visita, aos seus filhos ou netos, a obra feita por um seu antepassado. Mas, como prová-lo, se não existe ali nenhum testemunho disso.
Será que por um homem não ter diplomas (fez o exame da terceira classe primária e, tirou a carta de condução, já muito tempo depois da construção do monumento) mas um grande artista e mestre de obras, que sabia ler as medidas num plano como o melhor engenheiro ou arquitecto, não tenha direito a ser reconhecido pela sociedade?
Entre algumas das suas obras cito: O altar da nossa igreja matriz, uma autêntica obra prima todo cinzelado: Toda a cantaria onde assenta a talha dourada do Altar-Mor com cerca de 2,50m de altura, também toda cinzelada: As escadas do altar: Em Vilar Formoso, o quartel da Guarda Fiscal etc,.
Inauguram-se obras e, algumas logo votadas a um abandono total, (uma vergonha para a nossa terra ) mas o dia da inauguração lá está a lápide. Esta ....foi inaugurada por Sua Exc...

Alcainenses e não só, pergunto: O nosso conterrâneo e artista JOAQUIM DOS SANTOS (FRADIQUE), que erigiu o monumento, não merece uma pequena lápide com o seu nome, na base do seu monumento???.

Aqui fica o nosso apelo a quem de direito para que façam o necessário e, assim por fim a esta grande injustiça.

Joaquim dos Santos (Fradique)
09-05-1920 / 26-05-2003

Este monumento por volta do ano 1955, também serviu de palco para angariação de fundos destinados à construção do nosso Seminário Maior de Portalegre pelo bispo da época, D. Agostinho de Moura.
Na ocasião foi construído um grande patamar mais ou menos a meia altura da estátua, acessível por uma grande rampa, tudo construído em madeira.
No patamar, o Sr. Bispo recebia pessoalmente os donativos quase todos oferecidos pelas crianças que frequentavam as escolas.
Ainda me recordo de também subir a rampa todo contente e orgulhoso com meio arrátel de arroz e, após o donativo beijar o anel do Sr. Bispo.
O meu amigo Zé Patola, como o pai trabalhava na casa da D. Josefina Taborda Ramos, levou um cordeiro as costas, oferenda desta Senhora.

Fotos de Joaquim dos Santos (Fradique): cedida pela família.

Manuel Geada