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quarta-feira, 26 de fevereiro de 2014

Hospital de Alcains

Em tempos idos, Alcains já teve um hospital.
O Manuel Geada recorda-o no texto abaixo, excelente recolha de informação e reavivares de memórias que irão ficar para os atuais e vindouros... 
“Espero que fiques satisfeito com o meu trabalho”, assim se me dirigiu este amigo que alternando vida entre Alcains e França vai mantendo uma digna ligação à terra deles.
Obrigado amigo Geada.

Manuel Peralta


HOSPITAL JOSÉ PEREIRA MONTEIRO

Executando o que fora decerto a sua vontade e do seu falecido esposo, Comendador José Pereira Monteiro, foi em Lisboa em 16 de junho de 1951, que D. Maria José Miranda Monteiro fez o seu testamento.

Uma das principais disposições era, que na sua residência de Alcains, fosse instalado o Hospital José Pereira Monteiro com duas enfermarias, uma para mulheres com o nome da Fundadora, outra para homens com o nome do Fundador.
   
A instalação e administração ficavam a cargo do Seminário de S. José, cujos alunos e empregados, também ali podiam ser recebidos e tratados como os pobres de Alcains.
   
Como já aqui citado no Terra dos Cães. Além da casa destinada ao hospital, um prédio que possuía em Lisboa e deixava aos sobrinhos (filhos do seu irmão José Maria Miranda, com o usufruto vitalício de um olival (nos Escalos de Baixo) e duma casa e quintal em Alcains ( a favor da sua afilhada Antónia Lopes Valadeiro e o Salão Paroquial que construíu e ofereceu à paróquia de Alcains, deixava os seus bens ao Seminário de S. José com o encargo de afectar todos os anos ao Hospital José Pereira Monteiro a parte dos rendimentos dos referidos bens necessário  para a sua sustentação, e de aplicar o restante à manutenção do Seminário.

Além destas disposições, o testamento também previa que se o hospital viesse a ser extinto ou deixasse de funcionar por motivo estranho à vontade do Seminário, este ficaria dispensado desta obrigação, e todos os rendimentos seriam aplicados à sua própria manutenção.

  
Caso esta hipótese (não desejada) se viesse a concretizar, o hospital e todos os valores que tivesse adquirido após a sua fundação, revertiriam a favor do Estado que por intermédio da Direção Geral de Assistência, lhes daria um destino quanto possível conforme com a intenção dos Fundadores expressa no testamento.
   
Era esta a vontade de D. Maria José Miranda Monteiro no dia 16 de Junho de 1951, que viria a falecer no dia 11 de Janeiro de 1953.
   
Após a leitura do testamento, houve um pequeno litígio entre os sobrinhos e o Seminário: em causa estava o mobiliário da casa de habitação dos esposos. 
Depois de uma ação em justiça, esta decidiu a questão em favor do Seminário.

Entretanto o Seminário tinha iniciado  a preparação da casa para o destino que lhe tinham atribuído.

No primeiro andar a grande sala que foi a de visitas (segundo o testamento), seria a enfermaria para  mulheres com o nome da Fundadora, e na correspondente sala do rés-do-chão, a enfermaria para homens com o nome do Fundador. 


A Direção Geral de Assistência não aprovou a sala do rés-do-chão.
Esta não aceitação da casa tal como estava previsto no testamento, dispensava o Seminário da função que lhe foi atribuída: a “Fundação do Hospital”.

Por generosidade e vontade do Seminário em realizar o desejo dos fundadores e, sobretudo pela determinação do Venerando Prelado da Diocese, D. Agostinho Lopes de Moura, fizeram-se os trabalhos necessários que na época custaram 86 564$50.

Entre outros melhoramentos, resultou uma nova sala no primeiro andar para enfermaria dos homens, e o “banco” no rés-do-chão, que não estava previsto no testamento.

Ao mesmo tempo que decorriam os trabalhos, iniciaram a aquisição de material clínico, roupas e mobiliário que totalizou 69 601$60.

No dia 14 de agosto de 1954, estava elaborado  o projeto dos estatutos do novo hospital.
Assinados pela primeira direção administrativa, foram aprovados dia 12 de setembro pelo Secretário de Estado da Assistência Social e, publicados no Diário do Governo, n° 9, III série, de 12 de janeiro de 1955.

De acordo com o testamento que previa o hospital a funcionar dois anos depois do falecimento da Fundadora, a sua inauguração teve lugar a 11 de janeiro de 1955, data do segundo aniversário da morte de D. Maria José Miranda Monteiro.


Por iniciativa do Seminário, a cerimónia começou com uma missa na igreja matriz por  alma da Fundadora, celebrada por um dos professores Sr. Cónego Joaquim Maria Marques Falcão.

Às 18 horas, o ato inaugural com a presença da Direção do Hospital: Srs. Doutores Leonardo José de Sousa e Albano Proença de Almeida, os dois médicos contratados para  ali trabalharem.

Igualmente presentes os Srs : 
Luis Carrega, Presidente da junta de Freguesia
José Rodrigues Castilho, Regedor da Freguesia
José Maria Infante, Presidente da Casa do Povo
Alguns professores primários entre os quais o “Juiz de Paz” Prof. João Pedro Rodrigues, o pessoal de serviço no hospital, alguns doentes e numerosa população.

Após a visita ao hospital reuniram-se na sala do banco, onde Mons. João José Alves de Moura, Reitor do Seminário, e neste caso Presidente da Direção Administrativa do Hospital, fez uma pequena alocução relativa a este grande melhoramento para a nossa então aldeia.
    
Logo em seguida (antes de assinarem a ata da inauguração), os dois médicos de serviço iniciaram a visita aos primeiros doentes. 


(O Dr. Leonardo faleceu semanas depois a 3 de fevereiro de 1955, (em consequência de depressão nervosa) . A partir dessa data, o Dr. Albano teve a seu encargo todos os doentes do hospital.)

Finda a cerimónia, dirigiram-se todos para a igreja, onde estavam presentes os seminaristas mais adiantados com o seu Perfeito, Rev. Padre Francisco Rodrigues Chaves que cantaram um Te Deun de ação de graças.

Durante muitos anos, o funcionamento do Hospital José Pereira Monteiro foi regular chegando a ter cheias as duas enfermarias, e algumas pessoas na lista de espera.
Óbviamente que num hospital com esta dimensão, não se podiam ali tratar todas as enfermidades, porque  um certo tipo  de doença, num curto espaço de tempo, podia absorver toda a  verba de que dispunha o hospital  para o seu funcionamento durante um ano.

Com o decorrer do tempo e a mudança das condições sociais, o hospital começou a ter menos influência.


Na origem estão a situação económica que para muitos melhorou .
A casa  Casa do Povo  e outros serviços de assistência, também dispensaram muitos da caridade do hospital,  que nunca deixou de receber e tratar devidamente quem necessitava.

Em contrapartida o banco  sempre funcionou com muita intensidade, chegando a receber 20 a 30 pessoas por dia para pensos, injeções e outros.
    
Estes serviços prestados a qualquer hora do dia ou noite, exigiam grande disponibilidade e sacrifício da enfermeira, (nos primeiros dias a menina Belarmina, logo substituída por  Ana da Silva Cristóvao de 1955 a 1959 e Alice Lopes Chaves (Menina Alice) a partir do dia 1 de abril 1959), que por vezes tinha que interromper não só as  suas  refeições, como também o repouso noturno. 

Em 1974, alguém de Alcains em artigo publicado num semanário, fazia perguntas e levantou suspeitas acerca do Hospital José Pereira Monteiro, em relação a doentes que se diziam não admitidos, e à maneira como os doentes admitidos eram tratados.

O autor do artigo, criticou também o modo de agir da administração que nunca deu conta ao povo de Alcains da maneira como funcionava e, que segundo o articulista o povo não se orgulha do seu hospital porque o consideram  sómente de fachada.

A estas perguntas e insinuações, (citamos apenas as principais) a Direção do Hospital respondeu quinze dias depois no mesmo semanário, que o hospital tinha os seus estatutos devidamente aprovados pelo Secretário de Estado da Assistência, e com eles se conformava  rigorosamente.


Os bens deixados pela fundadora ao Seminário de S. José, destinavam-se a manter o hospital, ficando para o Seminário o excedente, que no testamento se supõe sempre existente.
Não esquecer que a administração do hospital, é obrigatória e gratuita por parte do Seminário que a Benfeitora não quis agravar mas beneficiar.

Com o passar do tempo, a parte reservada ao Seminário é hoje simbólica, porque com a desvalorização da propriedade rural, o rendimento do Monte S. Luis (a que se referia o articulista) , é actualmente apenas de 100 contos anuais (1974).

Manter com este rendimento o hospital e pagar embora quase simbólicamente o médico, enfermeira e pessoal e com percentagem da caixa, água, luz etç.: só por milagre.

Milagre, que só tem sido possível à custa sobretudo da parte  destinada ao Seminário por vontade da Doadora, e ainda graças à extraordinária disponibilidade do médico, da enfermeira e de todos os que servem o hospital.

É portanto indubitável que a Direcção do Hospital (O Seminário) não só cumpriu as disposições testamentárias da Fundadora do Hospital, como até ultrapassou a sua vontade, pois também se criou um Banco que funcionou permanentemente ao serviço de quantos o solicitavam.



“Chamar a tudo isto obra de “fachada”, além de injustiça é revoltante e ingratidão”, julgando por isso que o autor do artigo falava por si próprio, e não em nome do Povo de Alcains que não acreditamos, não seja reconhecido aos benefícios que lhe fazem.

Concluamos este capítulo resumindo os dados relativos à Fundação e ao Hospital “José Pereira  Monteiro” – Alcains,  aquela desde a data da morte da Fundadora em 11 de Janeiro de 1953, até 31 de Dezembro de 1978; e este desde a sua inauguração em 11 de Janeiro de 1955, até ao mesmo 31 de Dezembro de1978.


Rendimento da  Fundação

Dinheiro e acções - 466.517$10
Renda de casa - 210.290$00
Monte de S. Luis - 3.275.732$60
Soma - 3.952.539$70

Despesas da Fundação

Herança - 115.753$20
Monte. - 266.548$70
Seminário - 1.150.466$00
Hospital - 2.096.340$00
Legado - 22.101$00
Soma - 3.651.208$90

Movimento do Hospital
Internamentos

Homens - 330
Mulheres - 967

Banco

Inscritos - 7.192
Consultas - 6.402
Injeções - 7.341
Pensos - 8.936
Pequena cirurgia - 663

Quanto a contas que não devia ao povo de Alcains e muito menos ao articulista, podemos responder por nossa parte que já em 1970 contou publicamento qual a situação económica e o movimento do Hospital, agora actualizado.

Assim respondeu a direcção do Hospital a todas as perguntas, acusações e suspeições.

MG

Esposos Pereira  Monteiro

Comendador José Pereira Monteiro, nasceu em Alcains no dia 24 de fevereiro de 1865, e faleceu a 16 de agosto de 1940. 

Filho de família modesta, como todos os seus conterrâneos trabalhou muito, sobretudo nos primeiros tempos da sua vida. 

Homem dedicado e labutador, teve sorte na  carreira professional conseguindo juntar algum dinheiro, mas a fortuna de que mais tarde usufruiu, herdou-a da sua tia Sr. Maria dos Santos Monteiro, que não só o aconselhou a bem exercer a sua profissão, como também a administrar os bens de que dispunha.

Sua dedicada esposa D. Maria José Miranda Pereira Monteiro, também nasceu em Alcains a 16 de setembro de 1876, e faleceu a 11 de janeiro 1953 .

Casaram  na igreja matriz de Alcains a 21 de junho de 1902, e aqui faleceram  sem terem filhos.

Grandes benfeitores, desconhecemos muitas das suas boas ações.

Como Deus não lhes deu os filhos que esperaram, decidiram ajudar “filhos espirituais” começando por ajudar a diocese em1920 com vários donativos para o Seminário do Gavião.

Devido ao número sempre crescente de alunos e pessoal docente, este seminário depressa se revelou insuficiente para acolher toda a comunidade, daí a necessidade de encontrar um novo seminário.

Em janeiro de 1926, a revista “Flores do Seminário” fazia alusão a um acontecimento de grande importância para a diocese.

A mesma revista no mês seguinte, dava notícia que um generoso benfeitor, Ex. Sr. José Pereira Monteiro de acordo com a sua virtuosa Esposa D. Maria José Miranda Monteiro, que têm acompanhado com a sua bolsa a Diocese de Portalegre, vão erguer e oferecer à nossa Diocese na aldeia de Alcains um edifício destinado ao Seminário. 

Mas o filho espiritual que mais beneficiou a população (principalmente os mais  pobres) de Alcains, foi sem dúvida o Hospital José Pereira Monteiro que sempre funcionou sob a proteção do seu irmão mais velho. O Seminário. 

MG

segunda-feira, 3 de fevereiro de 2014

CARDOSOS e CASTILHOS...

...e se o motivo para Terra dos Cães... fosse???

Habituámo-nos há muito a ouvir que o quase sub-título Terra dos Cães estaria associado a Alcains, porque quando das invasões francesas, estes teriam encontrado por aqui gente que se lhes opunha e defendia como cães. Nem sei se esta ideia tem subjacente algum fundo verídico, mas creio que é o que a maioria dos alcainenses pensam.
No entanto o livro “Cardosos e Castilhos Albicastrenses – À Volta dos Palácios” – do prof catedrático e artista plástico José Martins Barata de Castilho, vem abrir algumas pistas, sem rigor histórico, mas muito de intuitivo, sobre este conceito de sermos da Terra dos Cães.
No livro citado, o autor refere a vinda para Portugal, cerca de 1500, de três Castilhos naturais da Cantábria; dois irmãos, arquitectos,  


Juan de Castilho e Diego de Castilho; outro João de Castilho, veio para Castelo Branco, onde casou com D. Joana da Costa. Provavelmente este Castilho, seria aparentado com os anteriores. Estes três Castilhos até nem terão sido os primeiros a emigrar para Portugal, mas são aqueles que em certa medida é possível pesquisar o seu percurso.  
João de Castilho era fidalgo de linhagem, não se conhecendo porém os motivos que o trouxeram para Castelo Branco, onde como já se referiu casou com uma menina albicastrense de família nobre.
A pág 58, escreve o autor “(...) Os Castilhos albicastrenses descendem de um fidalgo cantábrico ou “biscaínho”- do Golfo de Biscaia – que casou em Castelo Branco (...)” não se sabendo exactamente o nome da povoação cantábrica de origem, mas que, “(...) poderá ter sido de qualquer uma das povoações cantábricas a leste e oeste de Santander, ou mesmo desta cidade, onde houve solares de “Castillos”(...)” E mais adiante o autor, refere que a Heráldica de Cantábria, refere que “(...) Castilho (Castillo) é um apelido de fidalgos cantábricos que teve origem no lugar de Castillo (município de Arnuero, Cantábria) onde se localizava o seu primeiro solar.(...)” Eram fidalgos com armas e brasões, conquistados nas pelejas associadas à reconquista cristã da Península Ibérica aos mouros.


Portanto  os Castillos (Castilhos) vieram e pelo país se disseminaram.  
Em particular na Beira Baixa, há muitos Castilhos, sobretudo em Penamacor e ainda em maior número, em Alcains. E nas armas e brasões dos primeiros, predominavam os cães, como as fotos demonstram. E em Castelo Branco e mais tarde no Fundão, o seu Brasão  o comprovam.
Daí que na apresentação do livro em meados de Maio em Castelo Branco, no palácio que o autor do livro recuperou, tenha vindo à baila que talvez fosse a enorme quantidade de Castilhos em Alcains e os elementos que compõem o Brasão dos seus antanhos, que tenha trazido para esta terra o apelido pelo qual nos conhecem e do qual nos orgulhamos.
E se assim fosse, e não tenho argumentos científicos que o defendam, seria altura para repensar o Brasão desta terra, conjugando porque não, os Canteiros e os Cães.


O tema é interessante e até deixo aqui uma sugestão às autoridades autárquicas : que sem qualquer carácter reivindicativo mas apenas formativo, numa das habituais cerimónias com que é comemorada a elevação a Vila, convidem o Prof José Martins Barata de Castilho a vir falar sobre os Castilhos de Alcains. Ele que eu conheci, em finais da década de 50, na Escola Industrial e Comercial de Castelo Branco, embora mais antigo que eu, como José Martins Barata, do Comércio, talvez na altura o melhor aluno da instituição.


A sua luta para integrar no seu nome, “de Castilho”, apelido do avô, começou em 1969 e tal revelou-se impossível. Em 2011, voltou a tentar e conseguiu alcançar o seu objectivo.
Teve um percurso académico notável, de que um velho amigo que já partiu, Pelejão Marques, por vezes me falava, mas desconhecia o seu interesse no domínio das Artes Plásticas. E foi para expor as suas obras, que recuperou na zona histórica de Castelo Branco, um palácio em ruínas.
O livro surgiria por acréscimo.  Só me resta sugerir a sua leitura.
MC
Abrantes 2013.06.10


Nota. Como já repararam este texto do José Minhós Castilho pretende dar uma outra abordagem sobre a origem da terra deles...
Como ele diz, e bem, este blog é como um albergue espanhol, cabe sempre mais um, mesmo que não traga merenda...
Digo eu que, a um bom apetite, não interessa ruim tempero.
Tenho em armazém outros temas, nomeadamente do Manuel Geada, que a seu tempo serão dados à estampa.

Manuel Peralta