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quinta-feira, 15 de novembro de 2012

Junta da Freguesia, maio de 1980...

O tema anterior, distrate da escritura do terreno do solar Ulisses Pardal, tinha ficado em aberto, como agora se diz, suspenso. Tornava-se necessária a convocação de Assembleia, poder legislativo da freguesia, órgão que tinha poderes para tal.
O texto anterior, terminava assim...
“...a Assembleia da Freguesia foi convocada e... voltarei ao tema quando a chuva começar a cair.”
E como vou cumprindo aquilo que prometo, a chuva apareceu caindo copiosamente, chuva tipo cabelo de cão, macia, bastinha que regou tapada, quintal e hortinha!!!
Presidida pelo José Eurico Minhós Castilho e sendo extraordinária, o tema era único. Solicitar à Assembleia da Freguesia autorização para se fazer o tal distrate, em alcainês, anular o que se havia feito.


Lembro-me de ter contado aos membros da Assembleia e ao público presente, naquele tempo as Assembleias da Freguesia eram muito participadas, o modo como o Dr. Ulisses Pardal recebeu a Junta, que refiro...” fui aluno do Prof. Dr. Oliveira Salazar e este ensinou-me que a justiça pede-se de pé, e por aí adiante...”
O projeto para a construção do Infantário que, a ser construído, seria no terreno anexo ao solar, terreno excelente, em estado de abandono atual, com uma excelente frente para a avenida Gen. Ramalho Eanes, não terá sido aceite pela entidade responsável pela construção e, ao que presumo, a Junta da Freguesia de então, não terá conseguido, eventualmente por se tornar de todo impossível, alterar tal decisão.
O Dr. Ulisses Pardal, que por portas travessas foi informado da decisão e muito magoado estava por não ter tido, em tempo justo, conhecimento oficial da decisão, andava mais que indignado, furioso...


Diz a lei de “Murphy” que, “tudo o que pode acontecer, acontece” e começa a correr na Vila que o infantário iria para os terrenos da Pedreira.
Os terrenos da Pedreira, situados por detrás da antiga escola, haviam sido doados em tempos idos à Junta, pela família Trigueiros de Aragão. Na Assembleia a maioria dos membros tinha idade semiavançada e eram profundos conhecedores das rivalidades entre as famílias de Alcains.
Porque me sobra em vontade o que me falta em memória, não devo adiantar mais, pois seria desonestidade intelectual da minha parte inventar sobre o tema. Mas talvez no livro de atas da Assembleia se possa fazer mais alguma luz sobre a situação.
Posta a questão do distrate à votação, foi a mesma aprovada por unanimidade.


Foi no entanto consenso da Assembleia que a Junta deveria continuar a insistir junto do Dr. Ulisses Pardal, para que o terreno continuasse a servir em conjunto com o edifício, o valioso e muito apreciado trabalho que a Corporação das Irmãs Franciscanas Missionárias de Maria vinham prestando a Alcains.
Apesar do 25 de abril, escondido, o papel selado ainda por aí andava e a ata teve de ser fiscalmente selada para ter valor probatório. Então, qual menino que leva bem feito o trabalho de casa ao professor, lá fui ao Dr. Ulisses que ao ver a ata e depois de a ler me disse, “assim é que é...”.


Com este gesto, arranjei um amigo.
Tirou cópia e marcou por telefone dali mesmo o dia da escritura. No dia da escritura e depois de assinada, convidou-me e fui almoçar com ele.
Em 1980, os cravos de abril ainda tinham pé e, ainda não tinham murchado. O Dr. Ulisses que era um homem muito austero, teria em 1980 mais que a minha idade hoje, aluno de Salazar, confidenciava-me que a minha juventude o inquietava e que eu teria muitas dificuldades em conseguir que a Assembleia autorizasse a reversão do terreno para ele, isto é, precocemente e como homem avisado que era, desconfiava dos políticos... e mais não digo.
Se não deitaram fora, nos dossiês de organização que montei na Junta, devem lá estar os inúmeros ofícios que enviei ao Dr. Ulisses Pardal, pedido o Solar e terrenos anexos para Alcains.
As Irmãs Franciscanas mantiveram-se durante o mandato e tudo correu bem. Dois anos depois, na Pedreira, o Primeiro Ministro de então, Dr. Francisco Pinto Balsemão, inaugurava o novo infantário.


Mais tarde, presumo que no mandato do Engº Rogério Martins, o edifício e terrenos anexos, foram objeto de um protocolo de aquisição por parte da Câmara Municipal.
Fui convidado para a comitiva que com o Dr. César Vila Franca, visitou o edifício para a eventual aquisição. Recordo perfeitamente o que então lhe disse. Que a Câmara ao comprar o edifício deveria com empresa de turismo fazer parceria para ali se instalar pequeno hotel, com restaurante e discoteca para animação noturna e ajardinamento dos terrenos envolventes. A Câmara, na altura já com conhecidas dificuldades financeiras,  teria muitas dificuldades em adquirir o solar, renová-lo e, mais caro que tudo, mantê-lo.
Hoje, o solar... ALBIGEC, albicastrenses gestões culturais!!!


Naquele tempo, as PPP ainda eram meninas de coro, e o João Cravinho estudava então as SCUT... mas, a vida ainda era passada a escudos.
Várias vezes me encontrei posteriormente com o Dr. Ulisses Pardal, um homem culto e de muita sabedoria,  e foi para mim muito agradável, falar com ele de um Alcains do tempo em que tudo era muito difícil para quase toda a gente.
Conta-me o meu pai que, quando tinha 18 anos, em 1942, e estava a SMEL em plena laboração do minério, volfrâmio, na Cabeça Pelada toda a malta ia para o minério onde se ganhava bem. Num dia, o meu pai, ganhou dinheiro para comprar um excelente relógio de bolso, que já herdei e religiosamente guardo.
Mas não havia gente para colher a azeitona. A GNR, ao que o meu pai me diz, a mando do Dr. Ulisses, proibia a apanha do minério ao qual só se regressava, depois de colhida a azeitona.
Voltarei.

Manuel Peralta

1 comentário:

  1. Do tema aqui abordado, restam na minha memória alguns excertos e muitas "brancas"... Recordo-me de te ouvir falar da forma austera e reservada como o Dr Ulisses Pardal te recebeu e te falou que "a Justiça pede-se de pé"...
    Recordo-me da visita de Pinto Balsemão, quando primeiro ministro, a Alcains, creio que a inaugurar o Ciclo e o Infantário. E do convite, que fizemos ao Dr Carlos Robalo,do CDS, para estar presente no Ciclo e ele esteve, e creio que o seu nome até foi na altura publicamente evocado.Se o não foi, pelo menos foi-lhe dito pessoalmente, o prazer que a sua presença nos dava.A prova de que em Alcains, se agradece a quem defende os interesses desta terra. Eram os tempos da " ingénua utopia" da independência partidária, os cravos ainda não tinham murchado...
    De teres referido alguma apreensão da parte de Balsemão, ao vir à terra de Eanes, por quem ele não morria de amores, e da forma que o tranquilizaras...

    E pouco mais recordo...Passaram muitos anos...

    MC...2012.11.27

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