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terça-feira, 20 de setembro de 2011

Festas de Alcains

As festas de Alcains, popularmente denominadas festas de Verão, ou festas de Santo António são já, desde há anos, uma saudade.
A grandiosa quermesse, a barraca de chá, a venda da flor por um simpático grupo de meninas, as grandes corridas de bicicleta, as descargas de foguetes, a alvorada, o arraial, as cavalhadas em burro ou bicicleta, a Ferrugem de Portalegre, a Banda Carioca de Castelo de Vide, a orquestra do Troviscal-Bairrada, a Filarmónica Alcainense, os Alegres Albicastrenses, o Henrique Caniça, o Tchico Felício, a casa J.J.Baptista de Alcains, a aparelhagem sonora, o castelo, a latada, o fogo de vista... enfim, um sem número de actos e expressões que o tempo que tudo dá e tudo tira, se vai encarregando de recolher no baú dos trastes velhos, agora armazenado no forro, ou em arrecadação perto do ganal...


O fato novo, o vestido da festa, a missa, a procissão e o sermão, o namoro, as rifas, o baile , as prendas de quermesse passeadas e mostradas por pares pudicamente lado a lado, sem mão dada, por vezes já de braço dado se o destino já tivesse sido tratado.
A pé, de motorizada ou de bicicleta, chegavam os forasteiros, de Caféde, dos Escalos de Cima e de Baixo, da Lousa e até a pé, da Lardosa, de capacete na cabeça uns, de bomba da bicicleta no bolso de trás outros, que assim ornamentados, dançavam e passeavam na festa.
Os que vinham de bicicleta, usavam mola que apertava calça, para que, carreta de corrente, não tintasse dobra de calça permanente.
Chegados ao recinto, anunciavam-se, procuravam na quermesse a aparelhagem sonora da Casa M. Silva e o Chico Felício, interrompendo disco de vinil em que Fernando Farinha cantava O Miúdo da Bica, dizia... informam-se todos os presentes que acabou de chegar o Paulo de Caféde, o Mário da Lardosa e o Teles da Lousa... por exemplo.


Já tinham partido os corredores, um ou dois automóveis, duas ou três motorizadas que acompanhavam o Balhinhas, o Domingos Bispo, o Pirilau, o Massano, o Zé Treze, o Zé de Caféde, o Zé Pires, o Sarralhas, o Fiel da Lardosa, o José Peixe e o Mário de Andrade de Castelo Branco, o Conchegão dos Escalos de Cima e o Pires Esteves do Cabeço do Infante.
Três voltas por Alcains, Escalos de Cima, alto da Lousa, Lardosa e Alcains com os seguintes prémios.
Primeiro classificado, um euro e meio, segundo, setenta e cinco cêntimos, terceiro trinta e sete cêntimos e meio, quarto, doze cêntimos e meio e por fim o quinto classificado, com um pneu de bicicleta, brindado.
Entretanto, a comissão não se responsabilizava por qualquer acidente que pudesse ocorrer, isto é cada um corria por sua conta e risco, e porque uns eram mais fortes e outros mais fracos, dali, a comissão lavava as mãos, como Pilatos.
Em casa rancho melhorado, canja de galinha velha, arroz de coelho manso, papas de carolo ou farófias, e, partia-se para a festa ver as cavalhadas, assistir à chegada dos ciclistas, por a flor, beber um refresco, e de santinha de açúcar, azul ou cor de rosa ao pescoço, por vezes de vela acesa, que humedecia o apetecível colar doce, mirado, remirado por quem ainda não tinha, invejado.
Ao lusco fusco, jantava-se e partia-se então com pai e mãe, para o arraial observar a feérica iluminação que J.J.Baptista proporcionava, mais umas rifas na quermesse e lá se trazia mais uma manteigueira, por vezes um solitário, uma chaminé de candeeiro a petróleo e a sempre esperada garrafa de vinho do porto, Lágrimas de Cristo.
Ponto de encontro de todos os que estavam fora, reviam-se amizades, faziam-se grupos de familiares, de amigos ou de vizinhos, e ia-se então para a barraca que, de chá, apenas tinha o nome.


Laranjada e gasosa da marca Prata Cão de Alcains, cervejas Sagres, Marina e Cergal, eram a bebida principal.
Frango, muito frango assado, ceado, de música acompanhado.
Vencer a timidez da dança no estrado, queimada vistosa girândola de foguetes pelo Ti João Tabaco e pelo Eusébio, uns de resposta, outros de salva e até de lágrimas.
Uma verdadeira maravilha com que o nosso conterrâneo Henrique Caniça, muito melhor que o Cachena de Alpedrinha, nos brindava, um vistoso fogo preso e do ar, que em nada ficava àquem do melhor fogo do norte, uma verdadeira maravilha.
O castelo, sim o castelo que ao romper da madrugada tronitruava... e assim, nesse raiar do dia, a festa acabava.
Nestes tempos, que me lembre, registo ... a festa dos nascidos no mesmo ano, a festa das esposas que nasceram no mesmo ano, a festa onomástica ( com o mesmo nome ), a festa da malta que esteve na tropa, a festa da malta que estudou na mesma escola, a festa da romagem da saudade, a festa da malta que treina no pavilhão, a festa da gente que nasceu na mesma rua, a festa da família, um ou outro casamento, um ou outro baptizado... tanta solicitação que quase morro, como diz o meu pai ... não pode a cadela com tanto cachorro...

Manuel Peralta

Texto publicado no jornal Reconquista de 15 de Setembro de 2011

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