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terça-feira, 9 de novembro de 2010

Mandou-me aos Figos

Mas, quais?
lampos, ou lâmparos?
abêbras...!
brancas, pretas ou pardas?
de três em prato, ou três que enchem prato?
estevais, lefinos, pchichotes ou alváres?
se pretos e corigos nunca são demais,
então que venha um prato de bogalháis.

LAMPOS
“A minha até se vai alampar”…
Dizia o Zé Fava.
Com balde de figos lampos,
Que mão levava.
Gordos, pesados, rechonchudos.
Oh! sr. Manel, come-se tudo.

PCHICHOTES

Esverdeados se pouca sombra apanham, vermelhos acastanhados se pelo sol dourados.
De boca aberta choram baba e ranho, sempre que tomam banho.
Verdes por fora e vermelhos vivos por dentro, enganam gente… como a gente!!!

ABÊBRAS PARDAS

De samarra e pele grossa, apertada.
Passam Agosto a gosto, adoçadas.
Rogadas.
Se pele estala, abre greta em pele roliça.
Estaladiça.
Nem artrite… nem celulite… nem missa.

ABÊBRAS BRANCAS
Descoradas,
de verde sépia perdedor.
Macias,
doces como tias.
De feitio, lassas…
Boas pra passas.

PASSAS

…em cama de “tchosso”,
sem enxerga, e nas palhas...
bronzeiam-se ao sol…
sem palhas alhas.

Prenhes de doce,
concentradas…
Sem bicho,
escaldadas...

Sentado ou de pé.
Sabem muito bem
Com bagaço e café.

Manuel Peralta

Nota: Palhas alhas, são as cascas, palhas dos alhos que, amassadas com cinza, são uma excelente mézinha para curar cobrões, medicinalmente apelidados de ZONAS.

10 comentários:

  1. Na minha terra, ali pela margem esquerda do Guadiana,o figo foi actividade económica durante décadas, centrada nos meses de Junho (primeira camada, sobretudo para venda e consumo em verde-lampo e rei preto, a tostão cada um, se de bom tamanho e qualidade) e Agosto e Setembro (segunda camada, para passagem e venda em seco).À altura, situava-se ali perto, no concelho de Moura, ao que então se afirmava, um dos maiores figueirais da Europa, na Herdade dos Machados.
    Quando nasci, já os meus avós se dedicavam a esta actividade. Por isso fui retirado às saias da minha mãe pela 1ªvez aos três anos, para mudar de ares e com eles (também com os meus tios por vezes) ficar na secagem do figo durante dois meses no campo (2ª camada) e assim permaneci durante 15 anos, ininterruptamente, até que a vida me levou para Lisboa e para o Técnico; nos últimos 5/6 anos apenas com o meu avô ( a minha avó definitivamente muito doente), de quem era companhia e colaborador e de quem definitivamente me despedi, em Setembro de 1968,no pleno da minha última época,a caminho de Lisboa.
    Os sistemas de exploração mais frequentes para quem, como os meus avós, não tinha propriedades, eram às meias ou de renda.Na maior parte das épocas, o alojamento baseava-se em choupana de junco,de secçao triangular, com duas águas e uma dimensão interior aproximada de 1.5mx3.0m e uma altura exterior de cerca de 2.5m, feita ou recuperada anualmente. Ali guardávamos o figo seco até o mudarmos para a Aldeia e dormíamos em caso de chuva. De resto, a cama era ao ar livre, as distracções as estrelas e os sons da noite, pois às questões insistentes o meu avô costumava retorquir: "lá está a porra das perguntas". O meio de deslocação era burro, de carro, em pêlo ou sobre albarda.Quem sabe se não seria, na PT, quem mais horas tinha de dormida ao relento e de deslocação em burro, largos milhares de uma e outra certamente.Records de gente do campo, que mais records não pode ter!
    Passávamos o figo preferencialmente em esteiras em junco ou junça (ainda sei fazer), que se enrolavam nas noites mais húmidas, quando o figo, mais seco, já o permitia. Quando as esteiras não eram em número suficiente, usávamos camas de pasto seco.O figo levava regularmente volta, para lhe expôr todas as zonas ao Sol.
    Também me era permitido, enquanto criança, ter a minha passeira, pequenina, onde ia pondo os figos do rabisco que fazia. Constituia o meu mealheiro para a feira da Aldeia, no início de Setembro. Que me lembre, a receita nunca foi além dos 3.5 escudos.
    Esta actividade desenvolvia-se numa zona da freguesia, extensa, onde muitas famílias se concentravam numa altura em que as ceifas já haviam terminado ( ou estavam em vias disso)e o trabalho começava a escassear.
    Depois...bem, depois, em poucos anos foi um ar que lhe deu; a actividade cessou, abandonada pelas pessoas pela baixa dos preços de venda do figo; os figueirais têm vindo a morrer, desde então para cá.
    Este fim foi, durante 30 anos, um mistério para mim.Desvendei-o quando, ocasionalmente, pude pôr a questão a um dos membros da família proprietária da Herdade dos Machados. A resposta foi elucidativa:desaparecemos como produtores quando, no mercado internacional, surgiu a Turquia, com preços imbatíveis face aos custos da mão de obra que empregava. Ao que me parece,a Turquia lidera, ainda hoje e desde então,o mercado do figo. No Alentejo, a actividade praticamente não existe.O figueiral da Herdade dos Machados, velho e em extinção, é um hino funesto à globalização e ao comércio livre.Pelo caminho ficaram cerca de 800 postos de trabalho na altura da safra só naquela propriedade.
    Hoje, quero matar saudades plantando figueiras nos 7.5 ha que tenho junto ao local onde vivo.Pensei em 150 de diversas variedades, estou em tempo de decisões...
    Vamos ao figo, que "roubar"inocentemente uns figuinhos a quem os tem nunca fez mal a ninguém, se para saciar a fome ou um apetite ocasional....

    O anónimo de nome José Vasques

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  2. Só de olhar até engordo

    FilipaPeralta

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  3. O apontamento sobre os Figos na economia alentejana e a referência à Herdade dos Machados, remete-me para 1984, quando enveredei pela actividade na área dos Azeites, e uma acção em Moura, nos levou em visita de estudo à Herdade dos Machados.
    Focados no Olival, a importância dos Figos, passou-me ao lado. Mas o comentário sobre os mesmos e o seu enquadramento na economia e cultura porque não, na zona de Moura, é um hino à natureza e à Terra que os produz.
    E reavivou-me a visita de estudo aquela imponente Herdade, que andara pelos jornais, quando em pleno Verão quente de 75, a Reforma Agrária e as ocupações mais ou menos selvagens, quase tinham destruído.
    E recordo-me de lá ter visto pela primeira vez, Azeite embalado em ampolas de vidro tipo injecção, que eram vendidas em Lisboa, numa loja que hoje se diria gourmet.
    O belo comentário sobre os Figos, foi assim o catalizador de um rol de recordações, dum tempo já tão distante, em que até as Obras do Alqueva já tinham começado…
    MC

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  4. Durante anos convenci-me que sabia de figos; depois de te ler, fiquei com dúvidas. Sei agora que o meu conhecimento não é universal, como deveria para ser científico...
    Ainda assim, vamos lá falar um pouco do tema:
    -Bêberas:na minha zona vulgo "brebas", designação genérica para os figos da 1ª camada (nem todas as variedades a produzem), algo que se aproxima da definição que encontrei de "figo temporão, grande,preto e alongado"; ser preto parece-me um excesso, pois há, na dita camada, figos brancos...ficam anónimos?
    -Lampos:variedade que mais aprecio em verde, sem rival,os do teu primeiro prato;vejo-os referidos como lampos pretos, mas confesso que nunca vi os brancos e desconheço quem ...
    -Abêbras(brancas e pardas):figo que por aqui chamamos de "rei", branco e preto.Este último foi sempre muito abundante,de árvores pujantes e frequentemente muito desenvolvidas, mas daquele, o branco, apenas recordo uma figueira nos figueirais por onde passei ao longo de 15 anos. Fui encontrar uma segunda no quintal da minha mulher...É frequente ali ao lado, na zona de Moura. São variedades de 1ª e 2ª camadas na minha região
    -Pchichotes:confesso que não identifico, provavelmente por aqui não existirem,ainda que os mais pequenos me façam lembrar os figos raros, habitualmente mal desenvolvidos, que as figueiras lampas produzem na segunda camada
    -Passas:para nós são figos passados, pois reservámos o termo para uma variedade que assim designamos de "passa",que em verde não é especialmente saborosa e passada é das melhores, aquela que mais habitualmente encontramos embalada e à venda, de figos comprimidos e amassados entre si,ligada tradicionalmente ao Algarve, mas muito abundante na minha terra
    -Entre as restantes designações, não encontro mais qualquer variedade de figo do meu conhecimento
    -Na nossa terminologia e entre os de consumo em seco, lembro o branco (pouco abundante e de figueiras frágeis), o pé-curto, semelhante ao passa, mas menos fino na massa e na pele, mais secas e consistentes,o couto (de grande qualidade, mas de árvore frágil),o fino, por se esborrachar facilmente, por isso de manuseio difícil, ainda que doce e saboroso,os já referidos rei preto e branco (as vossas abêbras); deste último posso dizer que me lembro dele como o figo, raro na minha zona,que uma ou outra família dita rica procurava.
    A todos estes figos eu ia; se não estiverem dispostos a aturar-me, não me mandem ao figo, mas à fava.

    O anónimo José Vasques

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  5. Não ficaria de bem comigo próprio se me permitisse a manutenção do lapso que cometi no meu anterior comentário,ao esquecer-me de duas variedades da minha zona.Trata-se das variedades que designamos de roxa e preta, pela coloração dos frutos em verde. Julgo vê-las, ao passar, em abundância no Ribatejo.Os seus frutos em seco não são de primeira qualidade face às variedades disponíveis na região. Em verde, o figo roxo é bastante doce, ainda que a sua qualidade global se situe longe do lampo ou do rei.

    O anónimo José Vasques

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  6. Tenho receio que me esteja a exceder para quem visita este espaço, mas ficaria inquieto se deixasse passar estes momentos ("Mandou-me aos Figos" e "Filho de Sapateiro, se não Doutor..."), em que intervim, para deixar uma alusão aos que foram arrancados dos sítios onde viveram as suas infâncias, por pais tantas vezes heróis, pelos sacrifícios que tal representava à época, na procura denodada de melhores dias para os filhos. A opção foi nobre, mas o nosso sofrimento, o dos filhos, foi grande, ainda que por uma boa causa.
    Martinho Marques, na minha opinião o maior poeta alentejano vivo, amigo e da nossa idade, tem um poema que exprime bem essa saga, de que me atrevo a transcrever parte:
    "CANÇÃO DA INFÂNCIA
    À beira-Terges-e-Cobres
    entre Alcaria e o Mendro
    num casebre dos mais pobres
    entre trigo e aloendro
    dei eu os primeiros passos
    no cerne de uma charneca
    por tojos estevas sargaços
    entre o dilúvio e a seca

    Aos dois anos era o vento
    o meu cântico e baloiço
    que hoje ainda canto e oiço
    no meu sangue em movimento

    Aos cinco o que se oferecia
    era o mundo em holocausto
    um perfume de alegria
    num frasquinho de mentrasto

    Aos seis anos tinha cão
    tinha fisga e tinha anzol
    brincava de sol a sol
    entre o Sol e a solidão
    cavalgava marmeleiros
    fisgava rãs e verdelhas
    caçava ouriços-cacheiros
    caracóis e peneireiros
    e na seiva dos ribeiros
    tinha barbos e pardelhas
    Tinha grilos consagrados
    ao meu silêncio ladino
    com asas de violino
    que orquestravam descampados
    tinha túberas marmelos
    amoras de silva figos
    mel de abelha cogumelos
    magustos e outros amigos
    que do sol de abrir braseiros
    com raios que são tições
    e do trigo eram trigueiros
    e eu tinha-os por companheiros
    quando armava aos trigueirões

    Aos sete fiquei a saque
    separaram-me do campo
    aos sete tive sarampo
    e por muito que me pese
    é justo que aqui destaque
    que aos oito tive um ataque de catequese
    ....".
    Conheço quem ainda hoje tenha dificuldade em se recolher sem que antes, ao fim do dia, tenha reservado alguns minutos para olhar os campos da sua memória...

    O anónimo José Vasques

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  7. Figos numa loja gourmet…

    As travessas de Figos que iniciam o tema, ficariam bem enquadradas numa vitrine de qualquer loja com produtos gourmet…
    Não tenho dúvidas que uma sociedade entre “o homem do leme deste Blog” e o seu amigo alentejano, colocaria no mercado um produto de muita qualidade!
    Quem sabe até se a erudição quase poética com que ambos tratam o tema, não faria cair em desuso alguns pregões do imaginário português, “ como quem quer figos, quem quer almoçar”, por outros mais emotivos e como tal, com sucesso assegurado!
    Os conhecimentos revelados acerca de Figos, são arrasadores e deixam-me sem palavras…
    Se enveredam por outros produtos hortículas, com a mesma dose de conhecimentos, ainda se arriscam a serem convidados para acessores não
    remunerados em alguma cooperativa.
    Enfim reduzo-me à minha insignificância, em que até nem conheço a variedade, com que a minha mulher, alentejana, prepara “casamentos”, em que a passa do figo é aberta e enriquecida com miolo de noz.
    Garanto que é muito bom!
    MC

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  8. Torres Novas

    Figos em Torres Novas

    Algarve Norte
    Lampos
    Corigos
    Pretos
    Paraiso
    Lanjal
    Rei
    Lampos

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