Páginas

terça-feira, 1 de maio de 2012

Paulo Reis/Carlos Folgado, no TRIBUNE de GENÈVE


Ao longe, jornal debaixo do braço, vi aproximar-se o ti João, pai do Paulo Reis (Pionto), que apareceu sorrateiro, no quintal do agricultor de letras.
Eu, em fato de horta, ele, de preto sapato de passeio e calça bem vincada, que pedia meças a alva camisa, asseada.
Os canteiros sempre foram em Alcains, mais “manientos”, que os pedreiros.
E podiam sê-lo, ganhavam pouco mais, e por isso, os canteiros normalmente casavam com costureiras e os pedreiros “davam o nó” às terceiras... as que andavam nas terças, no campo, e como ganhavam ao terço, isto é, recebiam um terço do que colhiam, herdaram daí o nome de, terceiras.


Há até uma história que se conta, verdadeira, conheci os intervenientes, do pedreiro a quem chamavam o “camisa sem pescoço”.
Os canteiros, usavam camisas TV, com colarinho, normalmente mais caras visto que o colarinho com as entretelas e esticadores encarecia o produto final, por vezes até gravata, enquanto os pedreiros usavam camisa apenas com uma ligeira tira que dava volta ao pescoço, que abotoavam à frente.
Camisas tipo, barão vermelho, Judas, José Luis, sindicalista, que andou pela câmara de Cascais, de onde saiu assim como que pela porta do fundo…escura…sem honra e com pouca glória, retenho dos jornais, a memória.
Mas, adiante.


Ora o tal pedreiro, Joaquim de sua graça, para ganhar mais alguma coisa, foi trabalhar para Gonçalbocas, perto da Guarda, fixou-se mais tarde em Pinhel, e quando ganhou a primeira féria, mandou-a à mãe em carta escrita por canteiro amigo.
A mãe, terceira, não sabia ler, e deu a carta a ler à vizinha, costureira.
Dizia a carta... mãe mande-me um queijo, um taleigo de “zeitonas”, e, quando for à loja, com esse dinheiro, compre uma camisa com pescoço... traduzindo para linguagem de canteiro, camisa com colarinho.


Ali em plena rua, fez-se de imediato o batizado e o pedreiro Joaquim, passou a ser conhecido como o “camisa sem pescoço”, até hoje.
Mas voltemos ao Pionto e ao Folgado.
O ti João, orgulhoso trazia um jornal Suisso, Tribune de Genève, no qual o seu filho, Paulo, e o Carlos Folgado, vêm reconhecido o valor da sua arte, mestres em cantaria, na recuperação de “ le plus beau chantier de la ville”, em “ Eaux- Vives”, na “Maison des Paons”.
E para a Suissa partiram Paulo/Folgado, cheios de ilusões, para recuperarem plumas de pavões...
Em pedra de Paris, “fine, claire, lumineuse...”
Diz o articulista, da rua não se vê nada, “c´est dommage”, é pena, a visita devia ser obrigatória aos alunos das escolas, onde aprenderiam a arte em cada fase.
Porque considero digno de registo, decidi dar a conhecer aos mais de 52 898 visitantes do terra dos cães, a arte dos canteiros de Alcains.
Arte dispersa um pouco por todo o país, e bastante pela europa, nomeadamente em França, Paris e na Suissa.
Pena.
Muita pena.


Como nos tempos em que se “partia de noite e não se olhava, os campos que iam pisar, todos por dentro a abanar, como a terra em Agádir, então, folha a folha se desfolhava, no seu coração ao partir”... poesia/trova ao emigrante.
Emigração, de volta, com os melhores a partir, para a europa.
Por cá, os que ficaram, deixaram de receber o “dinheiro das pedras”, tudo parado, ninguém procura pia, pedras de forno ou cantaria.
Deixou de se ouvir o bater da maceta no cinzel, apesar de na estação, na frente da capela de S. Pedro, faltar um capitel...
Há sessenta anos, emigrava-se e imigrava-se, ia-se por qualquer atalho ou via, procurar o trabalho, que havia...
Hoje?


Manuel Peralta


Agradecimento

Ao ver este “post” no terra dos Cães, o Paulo remeteu email que publico.

Olá Peralta, foi com miuto agrado que vi o seu comentário muito bem elaborado sobre os canteiros na Suissa.
Aqui, felizmente já ganhamos dinheiro para camisas completas...
Mas o mais importante é o carinho e o respeito que as grandes entidades Suissas têm por nós.
Dão muito valor a este tipo de arte.

Muito obrigado.

Um Grande Abraço.

 

Na foto eu e Pierre Buch famoso escultor suisso amigo.
 

O nosso conterrâneo Carlos Marinho ao fundo o Francês Philipe, o escultor e eu.

1 comentário:

  1. Alcains...Terra de Canteiros...pouco mais que um slogan...

    E um MUSEU. É pena que aos poucos caminhemos neste sentido. A espuma dos dias conduz-nos numa direcção sem retorno à vista. Por isso, cada vez mais escassas as possibilidades de relatar "estórias" como a deste alcainense na Suíça, fazendo juz a esta Arte e sendo um motivo de orgulho para o seu familiar. E ainda bem que este a levou ao Terra dos Cães, onde de forma bastante colorida foi enquadrada.

    Acredito ser importante para os vindouros, daqui a dezenas de anos, disporem da hipótese de conhecerem onde mergulham as suas raízes, e muitas das obras que os alcainenses, por esse país fora e mesmo além fronteiras, realizaram.

    E com os recursos multimedia que hoje existem e uma estrutura como o MUSEU, creio que a recolha e conservação dessas memórias seria um projecto com pernas para andar.

    Há cerca de quarenta anos atrás, João Santos, então presidente da autarquia e ele mesmo um ex-canteiro, já defendia este projecto.
    Desconheço se algo foi entretanto efectuado.

    Se o não foi, fica pelo menos a sugestão...e não é a primeira vez que aqui a deixo.

    Porém se algo já foi feito, estão de parabéns quem tal realizou, que revelaram a visão de como preservar as Memórias desta terra, cujo cartão de visita já foi: Alcains...Terra de Canteiros...

    MC

    ResponderEliminar