Páginas

terça-feira, 15 de março de 2011

SARAIVA, MARIA DA CONCEIÇÃO

ZELADORA
CAPELA DO SENHOR DO LÍRIO


...esta capela faz parte da minha casa... tenho-lhe um amor... eu nem sei... já são muitos anos.

Assim se referia, Maria da Conceição Saraiva, Zeladora da Capela do Senhor do Lírio a uma das capelas, se não a Capela, mais bem estimada de Alcains.


Por volta de 1980, quando veio morar para perto do cemitério, apurou que a capela estava muito abandonada.

Só excepcionalmente a Menina Arminda, por altura das festas de Natal, da Páscoa e dia de Todos os Santos, com sacrifício, vinha da estação de caminho de ferro, onde morava, colocar umas flores e fazer a limpeza possível a algo abandonado.


A idade, a distância, o cansaço acabaram por tornar as visitas da Menina Arminda ainda mais excepcionais e é então que a Maria Saraiva pede a capela à Menina Arminda.
E esta, deu-lha.
Assim me contou a Maria da Conceição Saraiva.

Nossa Senhora do Carmo
Padroeira das Almas do Purgatório

Faltava entretanto vencer outro obstáculo, o Coveiro.
Alentejano, muito simpático, sem qualquer letra mas de trato e educação esmeradíssima, o senhor Manel que, por vizinha, tratava a Maria da Conceição Saraiva, de imediato anuiu ao pedido da sua vizinha.

Este coveiro alentejano era uma paz santa, reparem, paz e ainda por cima, santa, burrena, dizia-se no Degredo, uma bondade infinita, dava bom conselho a qualquer pessoa, não volta cá a entrar outro homem como ele... assim se referia a Maria da Conceição Saraiva ao seu falecido vizinho.

Santa Rita
Padroeira dos Impossíveis

A Capela não tinha toalha, a Nossa Senhora do Carmo não tinha dedinhos, a Santa Rita, muito velhinha caiu porque uma pomba que entrou na Capela deitou-a abaixo, as paredes degradadas sem pintura, salitre por todo o lado, enfim muita degradação.
Mas a vontade de fazer bem era tanta que a Maria da Conceição Saraiva meteu mãos à obra, limpou, lavou, pediu, organizou, e com muita fé no Senhor do Lírio, tirou a Capela e as Santas de tal martírio...
Hoje, graças ao seu persistente trabalho, vale a pena sentarmo-nos no banco e em reflexão pessoal observar um local de culto, muito, mas mesmo muito agradável.


Mulher de fé que é, pediu consentimento à Senhora do Carmo que não a levasse a mal, por a mandar arranjar, reparar...
Com o pouco dinheiro das poucas esmolas que iam caindo, mandou reparar a santa, reparação que custou cerca de 38 contos, 190 euros... como não chegou, pôs ela o que faltou.
Custeou as flores ao longo dos anos, pagou se seu bolso as 4 lanternas da capela, tendo as pinturas, azulejos e banco sido custeado pela autarquia.

Senhor do Lírio/Senhor das Santas Chagas

Antes de o actual cemitério estar onde está hoje, o cemitério de Alcains situava-se no local onde era a antiga Associação, hoje Biblioteca, e na oficina e forja do Ti Joaquim Russo, em terrenos frente à antiga loja e taberna do saudoso Ti Tobias no “rochi”, largo do Rossio.
Quando da transferência do cemitério ter-se à desencaminhado a imagem que acima se observa, e, ao que popularmente se conta, terá sido um lavrador que ao lavrar a terra com junta de bois, nas margens da Ribeira da Líria, terá levantado da terra a imagem até então soterrada.


Exposta na Capela do Cemitério actual, é então chamada de Capela do Senhor do Lírio.
A imagem, que retrata Cristo na Cruz, foi então apelidada de Senhor do Lírio, porque o Santo era Homem, caso fosse imagem de Santa, eventualmente, teria sido apelidada de Senhora da Líria... digo eu.
Recentemente, casal que não deu nome nem morada, bateu à porta da Zeladora da Capela do Senhor do Lírio e, depois de breve contacto, oferecem a imagem de Nossa Senhora das Graças para expor na Capela.

Nossa Senhora das Graças

Deixam 50 euros para a compra da mísula, ficando de passar mais tarde pela capela…
Já lá vão trinta anos, o marido, António dos Reis Sanches, de apelido Tchau, mais a família que o digam.
Na verdade, a maior parte das gentes de Alcains, não conhece a obra que a Zeladora fez e faz.
Nada pede em troca, conversa com os Santos e as Santas como se de pessoas de carne e osso se tratassem... sentada ou de pé... com fé.

São João

O Terra dos Cães, ao trazer à luz do dia estes casos de solidão na fé, de trabalho desinteressado para os outros , cumpre o seu dever para com a gente simples, que faz grandes coisas.
Comunhão, partilha, solidariedade... palavras... palavras... palavras gastas em púlpitos e em ministros com pastas.

Nossa Senhora da Conceição

Continue Maria da Conceição Saraiva, os Alcainenses de fé agradecem o seu excelente trabalho.

Manuel Peralta

4 comentários:

  1. Nos tempos em que vivemos onde o venha a nós e sempre a nós é uma constante, é bom sabermos que ainda há gente que faz o bem, sabendo que a sua única recompensa será a do “Altíssimo”.

    A benévola Maria da Conceição Saraiva é uma dessas pessoas. Grande zeladora da Capela do Senhor Jesus do Lírio, à qual ela dedica grande parte do seu tempo e algum dinheiro, prestando assim um grande contributo à comunidade Alcainense.

    O comentário que deixou um anónimo acerca da Capela é bem justificado: temos uma bonita e bem zelada capela.

    Já lá vão alguns anos tive o prazer de me encontrar na Junta de Freguesia com a Maria da Conceição e, enquanto aguardávamos fiquei sabendo que era ela a zeladora da Capela.

    A Conceição estava ali a pedir que lhe colocassem na capela uma caixa para as esmolas. Os devotos tinham por hábito deixar o seu contributo em cima do altar mas, mãos mal intencionadas aproveitavam-se da oportunidade.

    Vi a luz do dia e cresci naquela rua e, o cemitério por vezes também era para mim e meus vizinhos um campo de jogos. O falecido Ti Mané Coveiro (antecessor do Ti Zé Batata)não apreciava muito a nossa presença, porque com as nossas brincadeiras acontecia que lhe espezinhássemos as sepulturas.

    Havia ali na capela uma autêntica peça de museu, “o carro funerário”. De memória, só me recordo de o ver desempenhar a sua função duas vezes: no funeral do Sr. José André, e da mãe do Sr. José dos Reis. Os caixões eram pesados por causa da urna de chumbo. ( O carro era puxado por dois homens à frente, enquanto outros auxiliavam pelos lados).

    MG

    ResponderEliminar
  2. Voltando à Capela do Cemitério e ao carro funerário.

    Era no carro que era guardado o denominado “Caixão dos Pobres, ou Caixão do Povo ”.
    (conhecido pelos dois nomes).

    Recordo-me deste caixão ser utilizado algumas vezes.

    Dizia-se então: vai no caixão dos pobres - vai no caixão do povo.

    Naqueles tempos acontecia que algumas famílias não tinham a possibilidade financeira de comprar um caixão para oferecer ao familiar que acabavam de perder.

    Quando necessário(raras vezes) a Junta de Freguesia disponibilizava o caixão e, quando no cemitério a cerimónia religiosa terminada, tiravam o defunto que enrolado num leçol era metido directamente na terra.

    Tristes recordações para crianças que éramos.

    MG

    ResponderEliminar
  3. A Capela do Senhor do Lírio...a sua incansável zeladora e a sua história...

    Ainda há gente assim! Que em nome da fé se empenha em preservar o património de Arte Sacra da Vila e só por isso, a divulgação do seu nome neste espaço é inteiramente merecida.

    Quanto ao Cemitério já ter existido noutro lugar, não me recordo, absolutamente nada, nem nunca tal terei ouvido, embora tenha uma vaga memória da forja do Ti Joaquim “Russo”, pai do Zé “Ministro” que inopinadamente também já se foi de entre nós, ser próxima da Associação de Canteiros, senão mesmo pegada...

    Já lá vão muitos anos e as distâncias em Alcains, para os putos que então éramos, eram grandes.

    Acho no entanto curioso que na transferência do Cemitério, do Rossio para o lugar actual, se tenha desencaminhado uma imagem e esta mais tarde encontrada por um lavrador, quando agricultava para os lados da Líria!

    Encontro um certa semelhança para um facto que a minha mãe contava, que um ou ambos os sinos da Igreja, tinham sido encontrados por lavradores de Alcains e da Lardosa, quando lavravam na “folha da Lardosa”. E que o primeiro que conseguisse reunir os meios para a sua remoção e transporte, o , ou os, levaria para a sua Terra.

    Foi mais ágil o da Terra dos Cães, e contava a minha mãe, que se dizia que quando os da Lardosa vieram tentar levá-lo(s), uma das Torres da Igreja se terá supostamente inclinado, assumindo os presentes que aquele sinal, era a reprovação para a sua atitude, levando-os a desistir do intento.

    Mentira! Verdade! Lenda! Quem sabe onde começam e acabam as mesmas!

    Isto para referir que os lavradores de então, não tinham os subsídios da CEE, mas eram gente abençoada com tais divinos sinais.

    E termino talvez como deveria ter iniciado este apontamento: que a incansável zeladora perdure por muitos anos e que o Senhor do Lírio, proteja os alcainenses e já agora o local onde foi “resgatado” - a LÍRIA!

    Bem precisados uns e outros dos seus bons ofícios!...

    MC

    ResponderEliminar
  4. A Rua do Cemitério das minhas memórias...

    A esta Rua está indossoluvelmente ligado um alcainense, Manuel Pedro Lopes, com quem uma geração de alcainenses, “treinavam” nas férias de Verão, os conteúdos das classes da Primária que os aguardava a partir de 7 de Outubro.

    Tinha o Pedro Lopes, inegáveis qualidades pedagógicas e as matérias por si leccionadas eram uma boa ferramenta para os trabalhos que nos aguardavam a partir de Outubro.

    Pagava-se salvo erro 20$ por mês, para um programa de trabalho que se iniciava pelas 09 horas, intervalo para recreio, hora e meia para almoço e depois até salvo erro às 04 da tarde.

    Era além daquilo que ali se aprendia e que era muito,uma forma de socialização, na medida em que convergia para ali rapaziada, não sei se também raparigas, dos 4 cantos da Vila.

    E a Rua do Cemitério, era sobretudo a Rua onde se jogava, “ à barra”. A corrida e agilidade das crianças que então éramos.

    Futebol, era mais no Largo de Santo António, ali a umas dezenas de metros. É que a Rua do Cemitério não era, como não é, muito larga...

    E havia outro facto, com o qual ali mais directamente nos confrontávamos: os funerais, com a porta do “Mané Brasuno” em sinal de respeito, só entreaberta e todos em silêncio.

    E se era algum funeral de alguém, que teria falecido em circunstâncias mais trágicas, o pranto, a marca do desespero dos seus familiares mais próximos, ficavam na nossa cabeça a pairar.

    Recordo-me de um que nunca mais esqueci: o do Sebastião Gregório, irmão da Amália, hoje viúva do meu primo Manuel “dos Paus” que terá morrido afogado em Vila Velha de Rodão, numa excursão do GDA. E em que salvo erro o Zé Sequeira, morador na Rua do Cemitério, creio que também chegou a correr perigo.

    A vivência destes acontecimentos, entre um ditado ou uma sabatina de Geografia, ficavam nas nossas cabeças.

    Por sistema, eu só ia para o “Mané Brasuno” em Setembro e era o suficiente para preparar a Escola que começaria daí a um mês. A sua competência e mérito pedagógico eram tais, que era necessário marcar vez, porque o R/Ch onde ensinava não era um espaço muito grande.

    Sempre que passo naquela Rua, associo Cemitério a Saudade! Saudade do que fomos, do que brincámos e daqueles que mais tarde acompanhámos naquela Rua à sua derradeira morada.

    Não rima, nem é sinónimo. Mas para mim, aquela é em Alcains uma das Ruas da Saudade!

    MC

    ResponderEliminar