Páginas

sábado, 5 de março de 2011

Caqueiradas, Entremesadas, Contradanças, Entrudo, Carnaval...


Cartas de namoro de Carnaval.

Entretido que tenho andado com o bom tempo passado, entre cava e poda, eis que sem dar por tal, aproximou-se o Carnaval.
Por cá Entrudo, chocarreiro, de moças ao soalheiro a quem se pregavam partidas e se enfarinhavam em casas assaltadas.
Escondiam-se, normalmente fugiam para longe da mãe, e enquanto se enfarinhava, também se beijava e apalpava...

Carnaval em Coimbra
Caloiro aproveitando-se da criada Gina

Aquilo era um estofêgo... e no Entrudo dava-se então volta a tudo...
Naquele tempo as casas eram boas para as Caqueiradas... doze a quinze escadas de madeira e corredor de sobrado e estava o barulho amplificado.
Plástico não havia, vidro um luxo, mas sobravam os caqueiros que em profusão gozavam a merecida “retráite” em confortáveis galarissas.
Restos de alguidares de telho e de resmalte, braseiras de lata batidas por ferra que misturava em inverno munha e caramunha, pequenos seixos rolados mal ataviados que rolavam por corredor e escada em profusa e tonitruante caqueirada...
Àh seu “condanado”, seu malvado, gritava a Ti Emília da Zebreira, mulher do Motchacha que, descuidada que era com a porta, era uma mártir no Entrudo...

Caloiro metediço e criada Gina

Quem é?
Acudia assim a Ti Marizé Juliôa, a toque de argola de porta, batida por fio de saca de farelo, esticado da esquina da rua...
Deve ser vento, comentava, enquanto recolhia para dentro...
Visitada era a Ti Lurdes Paixão, por entremesadas, Palhinhas, sobrinhas da Pedreira, disfarçadas, de casal com menina em braçal... boneca em corpo de garrafa ataviada, com sensível rolha de cortiça em parco gargalo, que ao passar para braços de tia, rolha que caía, sem dar por nada, tia mijada...
Gargalhada!!!
Mártir, a janela do 1º andar da tasca do Ti Requeita, em pleno largo do Outeiro.
Não havia pilheira, onde mistura de cinza, cascarões de ovos, cascas semi-assadas de laranja, que não fosse visitada e esvaziada.
Porque a farinha era cara, usava-se esta mistura embrulhada em papel de jornal, profusamente atirada a tudo quanto era varanda e janela espreitada por dentro por moças com vontade de uma enfarinhadela...
De óculos de brita, com lentes de rede, dentuça de cebola, lençol branco na cabeça e vela acesa, assim se disfarçavam vizinhas, que visitava a vizinhança depois da contradança.
Deu brado... carta sem selo, multada, recebida pela Rainha de namorado, apalavrado.


Eram frequentes, estas cartas...


...vinganças por namoros não correspondidos...

...tinha de pagar o selo, nem sempre se levava a mal, porque era Carnaval.

Manuel Peralta

2 comentários:

  1. Em Coimbra...outros Carnavais...

    Suponho que as fotos se reportam ao Carnaval de 69, e na 1ª foto, da esquerda para a direita, temos um “caloiro” atrevido, o João Manuel Baptista, uma boazona “Gina”, protagonizada pelo “homem do leme”, eu e de sobretudo o bem apessoado Luís Figueira, nosso colega no Instituto Industrial e amigo da casa que nos acolhia. Na 2ª foto, mais completa, temos da esquerda para a direita, o nosso amigo Luís Figueira, a Isabel Leitão, disfarçada de Arafat, o irmão Miguel Leitão e a namorada Fátima, e a boazona “Gina”, que como já referi, é o barraqueiro “homem do leme”; à frente o “caloiro” Baptista, que mantém o seu assédio à boazona, e eu.
    Suponho que as fotos terão sido obtidas na casa que nos acolhia: o 132/R/Ch da Bernardo Albuquerque, aos Olivais.

    Duvido que a citada “Gina” não tenha descido a Rua e ido pelo menos ao Five! Ou aos Capangas!...

    Nem sei se foi neste Carnaval, que montámos uma armadilha ao Baptista, àcerca de uma eventual conquista!..

    Eram claramente outros Carnavais.

    Normalmente apanhava-nos no meio das frequências, e como não vínhamos à Terra deles,
    fazíamos uma interrupção na leitura das sebentas ; e havia uns bailes e umas festas que ajudavam a descomprimir.

    Recordo-me que houve um ano, em que de sábado a 3ª feira,e muito graças ao savoir-faire
    do Luís Figueira e parece-me que do Carlos Portugal, pertencente ao núcleo dos estudantes de Castelo Branco no IIC, houve festa todos os dias!...Terá começado talvez no Five e terminado na Fernão de Magalhães!

    Em conclusão, dávamos nos duro para alcançarmos os nossos objectivos, mas havia pausas.

    Irónico é que o “homem do leme” tenha escolhido para si, o nome de “Gina”, o mesmo de uma revista não aconselhável a menores de 21, e que viu a luz do dia com o 25 de Abril !

    Voltaremos um dia abordar os tempos de pausa daqueles alcainenses, que para ali estavam fazendo pela vida, por um futuro melhor que o dos seus esforçados pais, que neles se reviam. E felizmente todos cumprimos esse objectivo.

    MC

    ResponderEliminar
  2. “PARTES DE ENTRUDO”

    Como quase em todas as ruas na boa época havia sempre alguém que tomava as iniciativas por volta do Entrudo, a minha rua do Cemitério, também não escapava à regra.
    Tínhamos lá uma vizinha que direi como então se dizia, “o que esquecia ao diabo, lembrava-lhe a Ela”. Era a Ti Marizé Forneira que, com as suas chalaças fazia diversão em toda a rua e nao só.
    Na época do Entrudo ainda se aperfeiçoava mais. Quem conheceu a Ti Marizé deve recordar que era uma mulher bem contituída.
    Portanto, num dia de Entrudo depois de conseguir meter-se dentro do “fato de macaco” do Ti António(seu esposo), pôs uma gorra na cabeça, e pegou um banco, uma bolsa com a merenda, uma cana de pesca feita à pressa e lá foi pró Largo de Santo António, onde passou o dia a pescar num dos tanques (“sem peixes”) que ali existiam.
    É quase inútil dizer que até algumas mulheres que habitavam na Unha Negra, esse dia ao terem conhecimento do evento foram ao chafariz de Santo António à água, só para presenciar o espectáculo.
    Por volta do ano 80, aquando do casamento dum meu sobrinho, tive novamente a ocasião de me aperceber que a ti Marizé não tinha perdido nada do seu bom humor e, mais recentemente nas bodas de prata do Zé Forneiro, embora já com uma idade bastante avançada, continuava igual. Direi que era um desses muitos bons talentos que por aí andam perdidos.
    Tal como a conheci esta minha vizinha de infância, uma mulher com um coração tão bondoso e, sempre pronta para ajudar o próximo: acredito que ainda hoje faça rir os anjos.

    MG

    ResponderEliminar