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quarta-feira, 8 de julho de 2015

Pirilau

Pirilau
David Pirilau
David Caetano Félix


Ganhou o Pirilau...
Mas qual?
O Raul ou o David?
O da bicicleta, o David, um artista, o corredor, o ciclista.
Era assim, sempre quando o David corria na sua bicicleta, nas festas de verão, um pouco por todas as localidades das redondezas. Esguio, de perna curta, de gordura enxuta, franzino, este ciclista menino...
Filho de “sardinheiros”, ele o pai, António Félix e a mãe Maria Emília Caetano, tiveram seis filhos, quatro rapazes e duas raparigas.
Já agora e, a propósito de sardinheiras, sempre me causou “imbeleique” porque é que em Alcains não havia peixeiras? 
A Ti Carquita, a Ti Arraiana, a Ti Pirilau entre outras, eram apelidadas de sardinheiras enquanto noutras localidades eram apelidadas de peixeiras.
Reconheço agora que, nas caixas da sardinha, efetivamente só aparecia sardinha, algum, pouco, carapau e parcos chicharros, daí que o nome da sua profissão estivesse ligado ao produto “core”, que vendiam. Sardinhas. Logo, sardinheiras.
Adiante.


O David, agora na “ retraite “ e a viver em França e que no barbeiro reencontrei no verão passado, foi dos últimos ciclistas populares a levar o nome de Alcains às redondezas.
Fez a quarta classe, trabalhou nas obras, pedreiro, e com o dinheiro que ia ganhando e poupando, comprou uma bicicleta.
Mas que bicicleta?
O seu irmão, Pirilau Raul, um verdadeiro artista, aventureiro, e que, quando as comédias vinham à praça, e, sempre que o palhaço pedia à assistência um voluntário, o Pirilau Raul, saltava de imediato para debaixo do petromax, instalado no trapézio.
Tudo isto perante o embevecido ar da Ti Piedade Esgueira e do Mané Pi, seus vizinhos, com anual assinatura de camarote de primeira vista.
De tanto saltar, certa vez, saltou um muro e foi às laranjas. Apanhado, tinha de pagar multa, e, sem dinheiro e por cem escudos teve de ao irmão David, vender a bicicleta, e, assim, nasce um ciclista.
E começou o David, a treinar, a correr, sem fim pedalar, sem qualquer apoio, mas com uma enorme vontade de vencer...
Alcains, Lardosa, Escalos, quer de cima quer de baixo, S. Miguel D´Acha, Medelim entre outras localidades, por ali correu, disputou, pedalou com outros camaradas provas de ciclismo que traziam para a estrada e para as ruas, os apoiantes e os muito entusiastas de então.
Sem qualquer apoio...


Conta que nas corridas em que participou se não era primeiro era segundo, o seu grande rival era o saudoso FIEL da Lardosa, recentemente falecido.
Numa festa na Lardosa e no sprint final, iam ambos colados, o Fiel caiu, o David passa por cima dele, e de bicicleta pela mão, corta a meta em primeiro lugar.
A correr em casa a comissão das festas, quis dar o prémio ao filho da terra, Fiel, mas a GNR de Alcains, obrigou a comissão a dar o prémio ao David.
Em 1968, em Lisboa, numa prova que catapultou Alcains para o ciclismo, pois foi objeto de notícia nos jornais nacionais de então, prova essa organizada por um conjunto de Alcainenses, João Batista, Vitor Serrasqueiro, Minhós Castilho, Félix Rafael entre outros, o David ficou em 4º lugar, isto porque saltou um pedal da sua bicicleta, e apenas com uma perna fez o sprint final.
Desta prova há um post no terra dos cães denominado “ciclismo em Alcains” um dos post mais visualizados, onde se detalha esta aventura que esteve na base de termos em Alcains finais da Volta a Portugal.
Mas a vida por cá estava mal...


A salto, emigra para a França. Trabalho nas obras. Sem passaporte...
Não querendo ser refratário, regressa a Portugal, para a tropa. 
Desde Oxerre até Alcains, vem então de bicicleta. Nove dias em cima dela, a duas rodas, por montes e vales.
Radio telegrafista na Guiné Bissau, 22 meses de comissão, regressa à então metrópole com o 25 de abril.
Parte então para França, onde reside, tem agora 65 anos, casou, 4 filhos, todos, família, lá.
Os prémios não passavam então de umas taças, medalhas, uma ou outra garrafa de Lágrimas de Cristo e, dinheiro, sempre pouco.
Conta que o FIEL era melhor rolador, mas ao sprint o David passava-lhe a perna.
Numa prova em Medelim, correu entre outros com o “Basuca”, o Carlos Rosa. Como este tinha lá a namorada, combinaram, e o David deixou-o ganhar. Acabou por casar lá.
Mas a coroa de glória dele é uma marca  jamais batida.
Contra relógio Alcains, Escalos de Cima, alto da Lousa, Lardosa e final em Alcains em 41 minutos e 33 segundos, média de 39 quilómetros por hora, imbatível até hoje. Disse.


O David merece não ser esquecido, deu alegrias a muita gente, despertou imenso entusiamo, ajudou a reconhecer Alcains como uma terra de muitos e bons ciclistas.
Ainda hoje, humilde, discreto, simples,... a nossa terra, na generalidade, foi feita assim.
Obrigado, Pirilau, David.

Manuel Peralta

2 comentários:

  1. Um belo apontamento sobre o David Caetano Félix. O alcainense que viria de bicicleta de França até Alcains. Mas mais, eu e o Félix Rafael, fomos em 1968, os cronometristas que instalados na Farmácia do Sr Soares, em frente da qual era a linha de partida e de chegada, do famoso contra-relógio a que o David se refere. Era como que a apresentação da selecção que iria disputar o Grande Prémio de Iniciação em Lisboa. As duas provas já disputadas, ordenavam os ciclistas por esta ordem: 1º Fiel,da Lardosa; 2º David de Alcains e 3º João Augusto dos Escalos de Cima. Foi uma prova séria, com os apoios bem estruturados, garantia que as cancelas das Estações da CP em Alcains e na Lardosa não afectariam a prova, assim como a certeza de que a prova não seria perturbada nas terras natais dos ciclistas. Seriam salvo erro 6, teria que socorrer-me de uma foto já aqui publicada, e os ciclistas partiram pela ordem inversa da sua classificação nas provas já disputadas e com um intervalo entre eles creio que de 3 minutos. E foi inegável, que o David foi o ciclista que demorou menos tempo. Até com alguma surpresa para mim, confesso, mas os relógios não enganavam. Tínhamos dois cronómetros ajustados e eles não mentiam. Naquele dia o David foi o mais rápido, não me recordo já quanto tempo ganhou ao Fiel, que foi segundo e ao João Augusto o 3º. Da ordem dos restantes já não me recordo, mas o Domingos Bispo saberá. Creio que o quarto seria um ciclista das Sarzedas, creio que de nome Esteves, e que foi subordinado de MP na PT. Poucas semanas depois seria a prova em Lisboa, onde a Comissão de Ciclismo de Alcains, deu uma "abada" aos clubes da zona de Lisboa, que faziam formação, como o Pinheiro de Loures, Lousa, Arroios e outros. Impossível dissociar deste sucesso quem os acompanhou a Liboa, João José Baptista e Vítor Serrasqueiro. Eu já recomeçara as aulas em Coimbra e li orgulhosamente o que o Mundo Desportivo então escreveu. João Baptista prometera e no ano seguinte a Volta a Portugal, teria um final de etapa em Alcains. Era assim o ciclismo em Alcains em finais da década de 60...

    Zé MC

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  2. Mais um excelente trabalho do Peralta no Terra deles sobre o amigo e grande ciclista Alcainense David Pirilau.
    Marcou uma epoca no ciclismo regional e ate por vezes em algumas provas Nacionais, em tempos em que o trabalho profissional não era nada leve. Tambem uma palavra de reconhecimento para o Ze Castilho Alcainense de gema e grande bairrista que sempre deu o seu contributo em varias actividades principalmente nas lides desportivas. Parabens a todos e grande abraço.
    Jose Maria Teodoro

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