O Manuel Geada, em tema anterior, deu à estampa, isto é, escreveu a resenha histórica de como apareceu o hospital José Pereira Monteiro, como funcionou, serviços que prestou, até às vésperas do 25 de abril de 1974.
Como o tema me parece de interesse geral e, na medida em que, por um lado, a vontade de escrever, em mim, volta a renascer, e, por outro, por ter sido depois do 25 de abril de 1974 autarca com responsabilidades na gestão da freguesia, vou contar o que se passou com o edifício do hospital que então, fechado e abandonado, ameaçava ruina.
David Infante, antes do 25 de abril, repito, antes do 25 de abril, tinha levantado no Reconquista a situação do hospital. A resposta dada pelo responsável do hospital, o reitor do Seminário de Alcains, consta do tema anterior.
Se a memória não me falha, em finais de 1979 são feitas as primeiras eleições livres para as autarquias. Concorreram em Alcains três listas. “Por Alcains Concelho”, encabeçada por Helder Rafael, “Servir Alcains”, encabeçada por Manuel Peralta e uma terceira lista salvo erro da “APU- Aliança Povo Unido”, encabeçada por João Santos, popularmente conhecido por João Visga, calceteiro de profissão.
Por escassa margem de votos ganhou a lista Servir Alcains.
E, claro, a junta eleita, herdou a situação do hospital.
As boas relações que existiam entre a junta e o Senhor Vigário, para mim, o saudoso Padre António Afonso Ribeiro, foram determinantes no andamento de um ultra moroso processo com uma igreja então acossada por alguns, hoje considerados desvarios, que se seguiram ao 25 de abril.
Para mais, o edifício abandonado entrou na campanha, e, claro, nesta terra de pedreiros livres e muita costura tudo e todos, e ainda bem, opinavam sobre o que fazer para dar destino, um fim útil, ao edifício.
Para facilitar ainda mais a situação, o edifício em questão, era o vizinho da frente do edifício da junta, pelo que, ainda que a junta chutasse para canto a situação, tal não era possível face à proximidade existente.
Posta a questão ao Sr. Vigário este aconselhou a iniciar o caminho da pedras, pelo Seminário.
Por sua vez o Seminário na pessoa do reitor sugeriu uma ida ao Senhor Bispo... lembro-me de dizer ao Ti João Pereira, tesoureiro da junta, que era desta que vamos a Roma ver o Papa...
Naqueles tempos, sem lei das finanças locais, e eleição numa lista de cidadãos eleitores, as questões do desenvolvimento de Alcains, eram debatidas entre os eleitos nas Assembleias da Freguesia, e era o resultados destas decisões que a junta prosseguia.
Excluídas claro, as situações de gestão corrente, tudo o que fosse de interesse mais geral era ali debatido e solicitada a respetiva autorização para prosseguir.
Fomos a Portalegre, por a questão ao Senhor Bispo.
Este, cioso na defesa do património da igreja, mais que cauteloso na interpretação da nobre vontade do testamento da família Monteiro, e com muitas dúvidas sobre o sentir da população relativamente ao destino a dar ao edifício do ex hospital, informou-nos de que o tema teria de ser por ele proposto à gestão do património religioso cujos serviços estavam em Lisboa.
No regresso nem uma miga de peixe comida em Vila Velha de Ródão ajudou a diminuir a tristeza que por aqui passava.
Que fazer?
Entre triplas aspas, claro, como “ ” ”entalar” “ “ um Bispo? E mais difícil ainda, a Igreja? Como resgatar um edifício abandonado e colocá-lo ao serviço da comunidade?
De Portalegre trouxe um documento precioso que não conhecia, o testamento.
Se não o perderam, deve estar num dossier na junta da freguesia, pois ali ficou tal documento.
Lido, relido e treslido o testamento, ficou claro para a junta que havia ali uma porta por onde se poderia entrar.
Cito de memória...” se um dia, que espero que Deus não haja, o hospital deixar de funcionar, o edifício será entregue à direção geral da assistência, que lhe dará o fim conveniente, prosseguindo fins idênticos...”, assim rezava o testamento.
A direção geral da assistência era aquilo a que mais tarde seria a Segurança Social, no caso em apreço o Ministério da Saúde.
E para provar ao Senhor Bispo o sentir das pessoas de Alcains relativamente ao edifício do Hospital, decidimos fazer um inquérito à população.
O Senhor Vigário e o reitor do Seminário não se entusiasmaram com o andamento, “ cantante” da junta, preferiam antes um andamento mais “ moderato”...
Mas claro, quando 30 anos se tem, “twist again”...
Os resultados do inquérito foram esmagadores e pedi nova audiência ao Senhor Bispo.
Demorou, foi necessário ir à cerimónia do crisma para pessoalmente lhe pedir para receber a junta, agora já na posse do inquérito e com mais conhecimento, “ a luz divina” sobre o testamento.
Em Portalegre a situação foi analisada com alguma frieza, pois o Senhor Bispo tinha conhecimento do inquérito e dos resultados, e, estava efetivamente mais condescendente com o sentir da população.
Foi alertado para o parágrafo do testamento sobre o edifício deixar de funcionar como hospital e aí concordou com a nossa posição.
Prometeu dar um parecer positivo para a estrutura superior da igreja que geria o património, e que nos manteria informados sobre o evoluir da situação.
Desta vez em Vila Velha, no Rei Wamba, a miga de peixe deslizou sem as espinhas de antanho.
Isto que aqui se conta nestas palavras demorou anos a concretizar.
A junta seguinte do Engª Rogério, deu o passo final, e, hoje está o edifício ao serviço da população numa já muito acanhada Extensão de Saúde.
Valeu a pena.
Manuel Peralta
Claro que valeu a pena!...Estas diligências em Portalegre, não tinham os escolhos de "levar a carta a Garcia" mas andavam lá perto!...A descrição bem humorada do "homem do leme" é fascinante! E mais, aposto singelo contra dobrado, que as facturas das migas de peixe em Vila Velha de Rodão, e os custos com o combustível, nunca entraram no orçamento da Junta de Freguesia. Era assim o exercício do poder autárquico de então...Amor à camisola!...
ResponderEliminarMC...2005.04.05
Claro que a data do post. anterior está incorrecta. Tudo o resto está certo!...A correcção aqui fica: 2014.04.05
ResponderEliminarMC
A bem da verdade e para memória futura convém esclarecer, em relação ao processo do antigo hospital José Pereira Monteiro, que a Junta de Freguesia seguinte à do Eng.º Peralta não foi a do Eng.º Rogério mas sim a do Sr. João Santos. Em 1986, quando tomámos posse, o posto de Saúde funcionava na antiga Casa do Povo de Alcains em situação de grave deficiência, quer em termos de qualidade de instalações, quer em termos de espaço das mesmas. Para resolver este problema, numa primeira fase, a JF procedeu a obras de melhoramento e ampliação das instalações o que permitiu o funcionamento de mais valências de saúde de que Alcains necessitava. Concomitantemente, no seguimento do já descrito pelo Eng.º Peralta, também a "minha" JF fez a "peregrinação" à diocese de Portalegre onde, em conjugação com o Sr. Bispo, se delineou a passagem do património para o agora Ministério da Saúde, satisfazendo assim o descrito no testamento que em rigor penso que refere " Se, por hipótese que Deus afaste, o hospital deixar de funcionar, deverá o mesmo reverter para o ministério da assistência
ResponderEliminarque ........ ". A drª Ana Manso, presidente da ARS de Castelo Branco assume, a partir de então, um papel importante, primeiro na receção do património e, posteriormente na candidatura da obra, com projeto do arquiteto alcainense João Teixeira, para funcionamento como novo Posto de Saúde de Alcains, o que veio a acontecer no 2º trimestre de 1994, já com o Dr. Vieira Pires na ARS de então. Além de melhores condições e espaços ( também penso que já insuficientes) a requalificação do antigo hospital que sugeria abandono e a localização central do Posto de Saúde foram mais valias a considerar. A favor dos alcainenses.