A comunicação social dava nota e, o sentimento geral na população era de apreensão, primeiro, pelo fecho há já alguns anos do hospital e, depois, pelo estado de degradação que o belo edifício situado em local nobre da Vila, apresentava.
O edifício onde funcionou o hospital foi doado pelo casal José Pereira Monteiro à população de Alcains, mas a sua gestão, hospitalar, cabia à igreja, mais propriamente como primeiro responsável, ao senhor bispo da diocese de Portalegre e Castelo Branco.
O casal não teve filhos e, além desta doação, construiu e ofereceu também o edifício do Seminário, onde cheguei a contar cerca de uma centena de seminaristas, nas décadas de cinquenta e sessenta. Seminaristas estes que, participavam nas procissões, tinham uma boa equipa de futebol que participava em torneios e, muitas vezes, com as equipas dos escuteiros de Alcains.
Vinham nos dias primaveris passear para os Sobreirinhos e ali cantavam, corriam e assim se libertavam do cativeiro. Em terra de " PEDREIROS LIVRES E MUITA COSTURA" chamávamos-lhes "BANDOS DE CORVOS". Nas procissões iam à frente e, nunca misturados com os elementos do sexo oposto, evitando assim olhares pecaminosos sobre o dito...
O casal tinha também um monte agrícola, o Monte de São Martinho, de onde provinham parte dos rendimentos para manter o seminário. Toda a sua riqueza material, casal muito religioso que era, foi doada à diocese de Portalegre e Castelo Branco.
Como hospital, era o serviço assegurado por uma ou duas enfermeiras, Dª. Belarmina e, peço desculpa de a minha memória se recusar no nome da outra enfermeira e, pelos médicos da terra, na data os Drs. Albano e Atayde.
Lembro-me de em criança visitar ali com a minha Mãe um ou outro amigo ou familiar, subir umas mais que empinadas, ingremes, escadas de granito, e depois persignar-me e, de joelhos, fazer uma vénia ao santo ao santa que no altar ao cimo das escadas, abençoava os/as pacientes.
O hospital assegurava ainda apoio social aos quase miseráveis que os havia, desnutridos, errantes e toda uma população de carenciados que ali encontravam um acolhedor lar onde pudessem recuperar das agruras de vidas difíceis, sem lar, nem pão...
Que fazer?
Em Alcains, troquei impressões com o Sr. Vigário, Padre António Afonso Ribeiro, que me informou que o assunto dependia da diocese e do Sr. Bispo.
Fui a Portalegre falar com o senhor Bispo e, da entrevista, nem sim, muito menos não, talvez, antes pelo contrário... encanar a perna à rã, quando vim de lá, foi a minha convicção.
E, por outro lado, na comunicação social e na população o assunto Hospital, era tema presente e permanente.
Decidi fazer um Inquérito público à população, uma vez que, um ou outro escaldão que sempre se apanha a quem andas nestas lides, me foi ensinando e fui aprendendo, que, HOMEM PREVENIDO VALE POR DOIS.
Os resultados do inquérito foram quase todos no sentido de a diocese entregar o edifício à Junta da Freguesia, para que esta lhe desse o destino conveniente.
Quem não ficou muito satisfeito com o inquérito além do Sr. Bispo, foi o Sr. Vigário, pois do ponto de vista da hierarquia da igreja, o Sr. Vigário, era olhado como um colaborador que tinha deixado, na sua paróquia, fazer algo que punha em causa o património diocesano.
Tive de explicar ao Sr. Vigário de quem sempre fui e sou, muito amigo, de que as minhas funções me obrigam a separar o religioso do profano, e que, a degradação do edifício também não era um bom cartaz para a diocese.
Voltei a Portalegre, e, desta vez o Senhor Bispo, entregou-me ao Padre gestor do património diocesano.
Manifestou o desagrado da diocese com o inquérito e, afirmou que, o testamento que o casal José Pereira Monteiro fez sobre o edifício/hospital, não permitia que a nova utilização fosse outra que não a da vontade exarada no testamento.
Pedi então uma cópia do testamento, que não me foi, entregue de imediato.
Depois de várias cartas e, chamadas telefónicas de insistência, nos CTT eram de borla para a junta, fui então chamado ao seminário de Alcains onde pela mão do Senhor Cónego Chaves me foi entregue a cópia de escritura que deixei na Junta da Freguesia.
Recentemente em encontro com o Dr. Silvio Barata, que foi autarca em Alcains, trocámos impressões sobre o tema e recordou a leitura da escritura do testamento, que na autarquia de Alcains, leu.
De memória, relembro, da leitura do testamento, algo assim.
"UM DIA, QUE DEUS NÃO HAJA, QUE O HOSPITAL DEIXE DE EXERCER O BEM QUE ALI SE PRATICA, O EDIFÍCIO DEVE SER ENTREGUE PARA QUE CONTINUE O SERVIÇO SOCIAL".
A ideia geral é esta.
Manuel Peralta
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